ORQUESTRA DO PESSOAL DA VELHA GUARDA (1947-1952)
Os arranjos de Pixinguinha para a Orquestra do Pessoal da Velha Guarda representam o ápice de sua carreira como arranjador e um momento de síntese das influências de diferentes linguagens musicais brasileiras do período que vai de meados do século XIX até a década de 1940.
A orquestra era parte integrante da programação musical do programa “O Pessoal da Velha Guarda”, apresentado por Almirante na Rádio Tupi entre 1947 e 1952, sempre transmitido ao vivo do auditório da rádio. Além da Orquestra do Pessoal da Velha Guarda, o programa contava com Raul de Barros e o Grupo dos Chorões e com o duo Pixinguinha e Benedito Lacerda acompanhado pelo Regional do Canhoto.
Em cinco anos de programa, Pixinguinha escreveu centenas de arranjos para a formação da orquestra – material que se encontra em boa parte preservado em seu Acervo no IMS e que foi parcialmente editado nos livros Pixinguinha na Pauta (IMS/IOESP, 2010) e Pixinguinha Outras Pautas (IMS/IOESP/SESC, 2014). Não apenas pela qualidade e maturidade dos arranjos que executava mas também pelo extremo apuro técnico e virtuosismo de seus componentes, a Orquestra do Pessoal da Velha Guarda pode ser considerada como um dos momentos mais marcantes da produção artística radiofônica da primeira metade do século XX.
Sua formação compreendia madeiras (em geral flautim, flauta e clarinete, ou combinações destes instrumentos), saxofones (quase sempre dois altos, dois tenores e um barítono), metais (quase sempre três trompetes e três trombones), violinos (duas a quatro estantes) e base composta por piano, contrabaixo, bateria, percussão, violão e cavaquinho. Este singular conjunto orquestral mesclava, no dizer do pesquisador e arranjador Paulo Aragão, as sonoridades das bandas de música tradicionais, dos pequenos grupos camerísticos que atuavam em cinemas e teatros de revistas, dos conjuntos regionais de choro e, finalmente, dos naipes de percussão que animavam os ambientes de samba e carnaval da cidade.
O repertório – seguindo a linha de “resgate” da música popular brasileira proposta já no título do programa – mesclava compositores consagrados do século XIX como Ernesto Nazareth (“Turuna”, “Ferramenta”), Chiquinha Gonzaga ("Água do Vintém", além de um fantástico arranjo para o “Corta Jaca”) e Anacleto de Medeiros (“Cabeça de Porco”, “Terna saudade”), com compositores menos conhecidos como Henriquinho Dourado (“Passinho de moça”), Aristides Borges (“Subindo aos céus”), Luiz Nunes Sampaio (“Careca não vai à missa”), dentre outros – para além, é claro, de diversas obras de Pixinguinha que aparentemente foram escritas em primeira mão para a orquestra como “Marreco quer água”, “Vou andando” e “Caprichoso”.
Como acontece recorrentemente nas formações orquestrais de Pixinguinha, é hoje difícil precisar os nomes dos músicos que compunham a orquestra. Alguns deles podem ser identificados através das partituras presentes no acervo, tais como Luiz Americano e o trombonista Norato, que “assinaram” várias de suas respectivas partes. Sabemos também o nome do baterista João Batista das Chagas Pereira, o “Sutinho”, tal como orgulhosamente anunciado por Almirante em um dos programas como solista do magistral “Concerto de Bateria” de Pixinguinha. Infelizmente, porém, a maior parte dos instrumentistas permanece até hoje não identificada, dentre eles um excelente virtuose do flautim responsável por solos esfuziantes – como se pode observar na polca “Vou andando”, por exemplo.
As gravações da Orquestra do Pessoal da Velha Guarda jamais foram lançadas comercialmente: registradas em discos de acetato que tinham a finalidade única de comprovar a inserção de propagandas comerciais ao longo do programa, estes fonogramas teriam sido salvos da destruição – segundo o pesquisador Humberto Francheschi – por um contrarregra, que teria guardado e posteriormente doado o material a Almirante. Jacob do Bandolim, amigo pessoal do radialista, copiou parte significativa das músicas do programa em fitas de rolo que hoje fazem parte de seu acervo no MIS-RJ e foram digitalizadas pelo Instituto Jacob do Bandolim. Ao todo foram encontrados até hoje pouco mais de 70 registros da Orquestra do Pessoal da Velha Guarda.
As gravações marcadas com ainda não estão disponíveis.