Compositor, instrumentista, regente, arranjador e um dos pilares da moderna música popular brasileira, foi assim definido pelo crítico e historiador Ary Vasconcelos: 

“Se você tem 15 volumes para falar de toda a música popular brasileira, fique certo de que é pouco. Mas, se dispõe apenas do espaço de uma palavra, nem tudo está perdido; escreva depressa: Pixinguinha

1897

LINHA DO TEMPO por Pedro Paulo Malta

1897

Ano de nascimento do menino Alfredo da Rocha Vianna Filho, no bairro da Piedade, zona norte do Rio de Janeiro. A data consagrada nos livros de referência é 23 de abril, dia de São Jorge, mas um levantamento recente feito pelo pesquisador e músico Alexandre Dias, no cartório em que o menino foi registrado, aponta para outra data de nascimento: 4 de maio. Ele é um dos quatorze filhos de Raimunda Maria da Conceição, sendo quatro do primeiro casamento, com João de Oliveira Torres (Eugênio, Mário, Oldemar e Alice), e dez do segundo matrimônio, com Alfredo da Rocha Vianna: Otávio, Henrique, Léo, Oscar, Hermínia, Edith, Alfredo, Hermengarda, Cristodolina e Jandira. Assim como a data de nascimento, há divergências sobre o logradouro em que o menino veio ao mundo: se na Rua Gomes Serpa (como diziam as irmãs) ou na Alfredo Reis (como afirmava João da Bahiana), mas sabe-se que Alfredo era ainda bem menino quando sua família trocou a Piedade por outro bairro, mais próximo do Centro do Rio: o Catumbi, onde os Vianna foram morar, no número 44 da Rua da Floresta (atual Padre Miguelinho), uma ladeira que leva a Santa Teresa. É nesta região do Rio de Janeiro que Pixinguinha é criado.

Seu pai trabalha na Repartição Geral dos Correios e Telégrafos, onde é chefe de seção da usina de eletricidade. É também músico amador: toca flauta, sendo muito solicitado nas rodas de choro de então, como descreveria mais tarde Alexandre Gonçalves Pinto (vulgo Animal) no livro de memórias que publicaria em 1936, O choro: “Tocava de primeira vista, a princípio na sua flauta amarela de cinco chaves e, ultimamente, em uma de novo sistema”. Alfredo da Rocha Vianna (pai) também é conhecido por promover saraus que reúnem em sua casa grandes músicos, como os violonistas João Pernambuco, Quincas Laranjeira e Sátiro Bilhar, Candinho Trombone, o flautista Juca Kallut, o trompetista Luís de Souza, o soprista Irineu de Almeida e o maestro Heitor Villa-Lobos, entre outros. Em seu depoimento ao Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro, Pixinguinha recordaria a presença dos amigos de seu pai nessas reuniões musicais: “Eu ficava apreciando porque gostava de música. Mas quando chegava oito da noite, nove horas, meu pai dava ordem: ‘Menino, vai dormir!’. Eu respondia: ‘Perfeitamente, vou dormir’. Mas não dormia nada, porque ficava ouvindo os chorinhos bons que ele tocava. Gostava muito daquilo”. No futuro, caberá a Pixinguinha passar para a partitura a única composição de Alfredo Vianna (pai) de que se tem notícia: a valsa Tristezas não pagam dívidas.

Aproveitando-se do espaço que há no casarão do Catumbi (oito quartos, quatro salas e um amplo quintal), Seu Alfredo aluga alguns cômodos para os amigos músicos – motivo pelo qual o imóvel ficaria conhecido como Pensão Vianna. Entre os músicos que se hospedariam por lá estão nomes importantes, como o trompetista Bonfiglio de Oliveira, o violonista, pianeiro e compositor Sinhô (o “Rei do Samba”) e o compositor e instrumentista Irineu de Almeida – que leva a mãe, Dona Generosa, carinhosamente chamada de Vovó Generosa por Pixinguinha e seus irmãos. “O inquilino Irineu, que tocava trombone, oficleide e bombardino, foi quem ensinou música ao pequeno Alfredo e afirmou: ‘Esse menino promete’”, conta o cavaquinista e pesquisador Henrique Cazes, em seu livro Choro, do quintal ao Municipal. Já no livro Pixinguinha, vida e obra, o jornalista e pesquisador Sérgio Cabral expõe uma divergência quanto ao endereço da Pensão Vianna: a biografia informa que Pixinguinha costumava dizer que ela ficava na Rua Vista Alegre, mas que contou ao pesquisador Almirante que o endereço era Rua Eleone de Almeida, nº 27. O segundo endereço é confirmado no livro Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento, de Marília Barboza e Arthur de Oliveira Filho.

1898

1898

No dia 8 de maio, o menino Alfredo é batizado na Igreja de Santana (na Cidade Nova) pelo padre José Fernando Pereira, tendo como padrinhos Bernardino Gomes Ribeiro e Ana Affonso Ribeiro.

1900

1900

Nas brincadeiras de rua do bairro do Catumbi, o garoto Alfredo da Rocha Vianna Filho se diverte como a maioria dos meninos da época: jogando bola de gude e aprendendo a empinar pipa. No livro Pixinguinha, vida e obra, o jornalista Sérgio Cabral lista os nomes de alguns de seus companheiros de fuzarca: Amadeu, Haroldo, Mário Boi e Pedro Linguiça. “Entretanto, fracassou em todas as tentativas que fez no futebol”, afirma Paulo Pereira em um perfil sobre Pixinguinha publicado na Revista da Música Popular (edição de novembro de 1955), dando a entender que a magreza era uma das características do futuro músico nos tempos de menino – mesmo quando chegou à adolescência, manteve o peso da infância: 50 kg.

1905

1905

Não são muitas as informações sobre a vida escolar de Pixinguinha. Entre as poucas informações sabidas está a de que foi alfabetizado por um professor particular chamado Bernardes (que ensinava em sua própria residência, na Rua Miguel de Paiva, Catumbi) e que este recebia cinco mil-réis mensais de Alfredo Vianna (pai). Sabe-se também que o professor era severo nas aulas, punindo seus alunos com o uso da palmatória e obrigando-os a ficar ajoelhados – o que era especialmente penoso para Pixinguinha, que saía das aulas de alfabetização com dores terríveis nas pernas, como informa o jornalista Sérgio Cabral na biografia Pixinguinha, vida e obra, que traz aspas do biografado: “O joelho doía e eu chorava”. Os livros de referência informam outras duas instituições de ensino na sua trajetória, mas não se sabe quando e por quanto tempo estudou em cada uma delas. A primeira é o Liceu Santa Teresa, localizado na Rua dos Coqueiros, nº 35, onde ele teria sido colega de turma do futuro cantor Vicente Celestino. Outra instituição por onde passou o aluno Alfredo da Rocha Vianna Filho foi a Escola Popular do Colégio de São Bento, na Rua D. Gerardo (Centro do Rio) – instituição criada em 1912 para receber os filhos de famílias menos abastadas e onde também estudaram Lamartine Babo e Noel Rosa. Durante o período em que estudou na Escola Popular, o jovem Alfredo atuou como sacristão do Mosteiro de São Bento.

1908

1908

Em seus depoimentos e entrevistas, Pixinguinha estabelece como marco inicial de sua atuação como músico a idade de onze anos. “Com onze anos de idade eu já tocava meu cavaquinho. Fazia um Dó maior e um Sol maior, ensinados pelo meu irmão Henrique. Lá em casa, uns tocavam violão, outros cavaquinho. Gostavam muito de mim porque era garoto e tinha um ouvido muito bom. Ainda tenho, graças a Deus”, diria Pixinguinha em seu depoimento ao MIS. Em Pixinguinha, vida e obra, Sérgio Cabral descreve as aptidões musicais dos irmãos de seu biografado: Otávio (vulgo China) tocava violão, Henrique e Léo eram violonistas e cavaquinistas, enquanto Edith tocava piano.

Quando percebe o dom incomum do filho e sua desenvoltura para acompanhar choros no cavaquinho, o velho Alfredo Vianna passa a levar Pixinguinha a tiracolo para as reuniões musicais. É frequentando esses ambientes que o menino decide trocar o cavaquinho por um instrumento de sopro: a vontade inicial do menino é ganhar uma requinta (instrumento parecido com o clarinete, só que menor), mas o preço dela está acima das possibilidades financeiras de Alfredo Vianna (pai), que também acha o instrumento complexo para o menino. Pixinguinha ganha, então, uma flauta de folha de flandres. Vendo o menino tocar a “flautinha de folha”, o músico Irineu de Almeida – morador da Pensão Vianna – se impressiona com o talento do menino e recomenda a Seu Alfredo que o coloque para estudar música. E assim Pixinguinha e os irmãos vão aprender música com um colega de Alfredo Vianna nos Correios e Telégrafos: o bombardinista César Bórges Leitão.

Alfredo Vianna providencia também um exemplar da Artinha (antigo método musical, de Francisco Manuel da Silva), que serve de apoio às aulas, dadas três ou quatro vezes por semana. Os irmãos aos poucos desistem das aulas e Pixinguinha permanece, mas não por muito tempo – já que aprende depressa tudo que o professor tinha para ensinar. Em seguida, Pixinguinha passa a ter aulas com o próprio Irineu de Almeida, conhecido pelo apelido de Irineu Batina (pela sobrecasaca que costuma usar, mesmo nos dias de calor) e que toca oficleide – instrumento de sopro da família dos metais surgido na França do século 19 e que, no Brasil, é popular entre os chorões até o início do século 20. Através do oficleide, Irineu e outros músicos formatam uma das características marcantes do choro: o tipo de contracanto que é conhecido como baixaria e atualmente é realizado com mais frequência pelo violão de sete cordas. Os contracantos de Irineu inspirarão Pixinguinha nos anos 40, quando este trocar a flauta pelo saxofone e, nos duetos com o flautista Benedito Lacerda, fizer de seus contrapontos uma das marcas sonoras das gravações feitas pelo duo.

É na infância que Pixinguinha começa a tocar em festas e bailes, aos quais comparece levando a flauta e o cavaquinho. Passa a se considerar músico de fato numa reunião musical em Jacarepaguá, após ter tocado por meia hora a polca Língua de preto (Honorino Lopes) sem errar, para o espanto de todos. Pouco tempo depois, o músico mirim estará incorporado ao conjunto Choro Carioca, de Irineu de Almeida, sempre atraindo olhares curiosos, pois, como Pixinguinha contava (O Jornal, janeiro de 1925), além da habilidade com a flauta, “a minha cor, o meu tamanho (…) me tornavam interessante”. No livro Pixinguinha, vida e obra, o jornalista Sérgio Cabral conta que foi também por essa época que seu biografado experimentou bebida alcoólica pela primeira vez, como relatado pelo próprio Pixinguinha numa entrevista à revista Manchete, já na década de 1970: “Naquele tempo não havia Juizado de Menores e eu já trabalhava. O sujeito para trabalhar em música, no meio dos músicos, tinha de beber alguma coisa. Era para se inspirar melhor. Então, fui me habituando”.

A biografia escrita por Sérgio Cabral conta ainda que, “na volta das festas, com o dia amanhecendo, os companheiros do conjunto desintoxicavam-se consumindo o leite deixado em latões na porta dos consumidores”, prática da qual Pixinguinha dizia que não compartilhava. Mesmo assim, inspira-se no hábito para batizar sua primeira composição, o choro Lata de leite, prontamente incluído no repertório do Choro Carioca.

1911

1911

Ano decisivo para Pixinguinha, que está com 13/14 anos quando faz sua estreia fonográfica como flautista do conjunto Choro Carioca, que, liderado por Irineu de Almeida, tem em sua formação dois irmãos de Pixinguinha atuando como violonistas: Léo e Otávio – o China. A primeira música gravada por eles é a polca Nhonhô em sarilho (Guilherme Cantalice), seguida de mais quatro composições de Irineu de Almeida: as polcas Nininha e Dainéia, o schottisch Salve e o tango São João debaixo d’água, todos gravados na Casa Faulhaber e lançados com o selo Favorite Record. Outra música gravada neste ano pelo Choro Carioca é a polca Isto não é vida, de autor desconhecido. Nas gravações, Pixinguinha toca numa flauta de prata italiana, da marca Barlassina & Billoro, que recebe neste ano de presente do pai, que paga 600 mil-réis pelo instrumento, importado com o número de série 2.424.

O ano de 1911 registra também o início da atuação de Pixinguinha como flautista da orquestra do rancho carnavalesco Filhas das Jardineiras, que tem como diretor de harmonia Irineu de Almeida e, segundo o cronista Jota Efegê, em 1911 comemorava seu sexto ano de atividades – desde sua fundação, em 1905, na Rua Dr. Mesquita, localizada entre a Central do Brasil e a Praça Onze. Além de marcar o início da atividade profissional de Pixinguinha com a música de carnaval, sua participação neste rancho guarda um marco importante em sua vida pessoal, ainda segundo Jota Efegê: é aqui que conhece os parceiros inseparáveis Ernesto dos Santos (o Donga) e João Machado Guedes (o João da Bahiana).

Também em 1911, Pixinguinha tem sua primeira experiência profissional, na casa de chope La Concha (localizada na Lapa), como flautista do conjunto de Pádua Machado (pianista), que traz também em sua formação o trompetista Bonfiglio de Oliveira e o violonista Otavio Vianna (o China), irmão de Pixinguinha. No livro Pixinguinha, vida e obra, o jornalista Sérgio Cabral informa que seu biografado se apresenta no La Concha “muitas vezes com o fardamento do Mosteiro de São Bento”, sua escola na época, quando mata aulas para trabalhar, ganhando ordenado de seis mil-réis por noite. Cabral informa também que, pouco depois, Pixinguinha vai trabalhar em outras casas noturnas como o ABC (na Rua Mem de Sá, na Lapa), o Cabaré Cassino (também na Lapa, mas na Rua dos Arcos) e o Ponto (na Praça Tiradentes).

O mesmo ano de 1911 registra ainda a primeira vez que Pixinguinha se apresenta em um teatro – principal mercado de trabalho para os músicos nas décadas iniciais do século 20. Este teatro é o Rio Branco (antigo Cinematógrafo Rio Branco, localizado na Rua Visconde do Rio Branco, no Centro), onde Pixinguinha toca no lugar do famoso flautista Antônio Maria Passos (que cai doente, precisando ser substituído às pressas) na revista Morreu o Neves!, de Raul Pederneiras e Luiz Peixoto. Quem indica o adolescente Pixinguinha é o violonista Arthur Nascimento (o Tute, que já o conhecia da choperia La Concha). Tute vai até a casa da família Vianna chamar o garoto, que naquele momento empinava pipa. “Respondi: ‘Não, não vou, não. Eu, hein?’. Naquele tempo, o Teatro Rio Branco tinha muito prestígio. Mas minhas irmãs ficaram em cima: ‘Vai! Vai!’. Não queria ir, mas elas insistiram: ‘Vai! Deixa de ser tolo!’. Acabei aceitando”, recorda Pixinguinha em seu depoimento ao MIS. “Tute me apresentou ao seu Auler, que estava na sala de espera. ‘Esse moço é que vai tocar no lugar do Antônio Maria’. Seu Auler admirou-se: ‘Mas ele não é moço, não é nada. É um fedelho!’”.

Pixinguinha acaba caindo nas graças do regente da orquestra, Paulino Sacramento, e do dono do Teatro Rio Branco, que o efetiva no emprego.

1912

1912

Um ano após estrear como músico de carnaval, no rancho carnavalesco Filhas das Jardineiras, Pixinguinha se torna diretor de harmonia do rancho Paladinos Japoneses – isso aos 15 anos incompletos. A vivência em agremiações como as duas citadas e mais o rancho Reinado de Siva (do qual participará mais adiante) será uma das bases da formação musical de Pixinguinha, que neste ano de 1912 passa a fazer parte do Trio Suburbano, juntamente com o pianista Pedro Sá e o violinista Francisco de Assis. É também por esta época que o trompetista Bonfiglio de Oliveira passa uma temporada morando na Pensão Vianna.

1914

1914

É neste ano que Pixinguinha registra pela primeira vez uma música de sua autoria: o tango Dominante, que na partitura aparece assinado por “Alfredo da Rocha Vianna (Pizidin)”. O registro é feito na Casa Carlos Wehrs, uma das lojas de música da Rua da Carioca onde os clientes podem comprar partituras para executar em casa nas reuniões musicais com amigos e familiares – tipo de evento bastante comum, no qual algum pianista (amador ou profissional) comanda a música tocando polcas, maxixes, mazurcas, valsas e outros gêneros que são lidos em partituras adquiridas em casas comerciais como a Carlos Wehrs, Ao Bandolim de Ouro, Carlos Gomes, A Guitarra de Prata e A Melodia, entre outras.

A propósito desta primeira aparição pública do apelido do nosso personagem, vale observar que esse apelido passou por diversas grafias até se consolidar como nome artístico: Pizidin, Pizindim, Pinzindim, Pizinguim, Bexiguinha, Pixigui, Pixingui, Pexiguinha, Pexiquinha… Pixinguinha. Até esta última forma, o apelido que valeu como nome para Alfredo da Rocha Vianna Filho variou bastante desde sua infância: em parte por conta dos veículos de imprensa (cada um chamando o músico de um jeito) e também pela origem imprecisa do nome. Desde menino, dizia ele, a avó o chamava de Pinzindim – apelido que, dali a algum tempo, o pesquisador Almirante contaria que significa “menino bom” em um dialeto africano. Pixinguinha dizia ter “uma avó africana” e comentou o tema em seu depoimento ao MIS (1968): “Agora, Pixinguinha é porque eu tive bexiga, então eles me tratavam de Bixiguinha, Pixiguinha… Houve essa complicação de apelidos e eu não sei por que eu fiquei como Pixinguinha. Não sei se foi pelos discos. Não sei por que foi”. Imprecisões à parte, o que se sabe é que não existe “avó africana” na história de Pixinguinha, como garantiam três irmãs do músico, Cristodolina, Hermengarda e Jandira, que afirmavam que tanto a avó materna deles (dona Edelwirges) quanto a paterna (dona Pacífica) eram brasileiras e não falavam enrolado. As três informaram ainda que o apelido de Pizindim (ou Pizinguim) foi dado por uma prima deles de nome Eurídice (vulgo Santa).

Sabe-se também que “bexiga” era o nome popular da varíola: doença infectocontagiosa causada por vírus e que tem, entre seus sintomas (febre, dores musculares, vômitos…), pústulas que se espalham pelo corpo do enfermo e, uma vez cicatrizadas, ficam parecendo pintinhas escuras – como as que Pixinguinha tinha no rosto. O último grande surto da doença no Rio de Janeiro se deu durante a década de 1880.

Outro marco de 1914 é a criação do Grupo do Caxangá, cujo nome vinha da música Caboca de Caxangá, melodia de João Pernambuco e letra de Catullo da Paixão Cearense (que assinou a composição sozinho), um dos maiores sucessos do carnaval daquele ano. Seguindo a onda nordestina que vigorava na época, seus componentes se apresentavam de chapéu de palha e atendiam por apelidos matutos citados na letra de Caboca de Caxangá: João Pernambuco era Guajurema, Donga passou a ser Zé Vicente, Henrique Manuel de Souza foi apelidado de Mané Francisco, Nola virou Zé Porteira, Caninha se tornou Mané do Riachão, Osmundo Pinto era Inácio da Catingueira e Raul Palmieri, Zeca Lima. Já Pixinguinha atendia por Chico Dunga. Com essa configuração, o Grupo do Caxangá desfilou pelo Centro do Rio nos três dias do carnaval de 1915.

O ano de 1914 registra também o falecimento, no dia 22 de agosto, de Irineu de Almeida, o Irineu Batina, professor de Pixinguinha. A história conta que, poucos dias antes da morte, ele esteve na casa do aluno mais notável e se emocionou ao vê-lo interpretar na flauta a polca Dainéia, de sua autoria. O relato foi feito pelo cantor Carlos Vasques (que também atendia por Nozinho e era apresentador dos discos da Casa Edison) ao pesquisador Ary Vasconcelos.

1917

1917

Ano que registra o lançamento de Pelo telefone, maxixe assinado por Donga e Mauro de Almeida que entra para a história como primeiro sucesso carnavalesco identificado como “samba”. A imensa repercussão da música e a polêmica que se dá em torno de sua autoria – embora registrada por Donga, ela seria uma criação coletiva realizada numa festa na casa de Tia Ciata – desencadeiam uma troca de petardos musicais entre Sinhô (um dos presentes na casa de Tia Ciata) e a turma de Donga, que inclui os amigos João da Bahiana e Pixinguinha e mais outros músicos ligados às tias baianas da Cidade Nova, como Amélia (mãe de Donga) e Perciliana (mãe de João da Bahiana).

A primeira farpa musical será desferida em 1918, por Sinhô, com o nome de Quem são eles? No ano seguinte, o contragolpe vem em dose tripla: por Donga (Fica calmo que aparece), Hilário Jovino (Não és tão falado assim) e os irmãos Pixinguinha e China (Já te digo), este último com letra impiedosa destinada a Sinhô: “Ele é alto, magro e feio / E desdentado”.

Também em 1917, Pixinguinha passa a se apresentar como flautista no Cine Palais (Avenida Rio Branco), a convite do trompetista Luís de Souza, regente da orquestra do cinema. A atividade se estende até outubro de 1919, quando a temporada é interrompida, devido ao surto de gripe espanhola.

O ano de 1917 é marcado também por uma nota triste para Pixinguinha: a morte de seu pai, Alfredo da Rocha Vianna, em 13 de setembro, aos 56 anos.

1919

1919

Pixinguinha já morava na Rua Engenho da Pedra, no bairro de Olaria, quando cria nesse ano um clássico de seu repertório: o choro Um a zero, cuja composição é atribuída à vitória do Brasil sobre o Uruguai, por 1 a 0, com gol do atacante paulistano Arthur Friedenreich. A vitória, alcançada na tarde de 29 de maio, no Estádio das Laranjeiras, dá à seleção brasileira sua primeira conquista: o título do Campeonato Sul-Americano de Football daquele ano.

Em 7 de abril, realiza-se a primeira apresentação dos Oito Batutas – conjunto que é a principal novidade do Cine Palais na reabertura de suas portas, passado o surto de gripe espanhola. A criação do grupo é uma proposta do gerente do cinema, Isaac Frankel, que pede a Pixinguinha para formar um conjunto que possa se apresentar na sala de espera do Palais, fazendo concorrência ao Cinema Avenida, em cuja sala de espera se apresentava a Orquestra de Cícero Menezes, com grandes músicos como o pianista Augusto Vasseur e o trompetista Bonfiglio de Oliveira. É o próprio Isaac Frankel que propõe o nome do conjunto – Orquestra Típica Oito Batutas – que conta em sua formação com Pixinguinha (flauta), Donga (violão), China (voz e violão), Nelson Alves (cavaquinho), Jacob Palmieri (bandola e reco-reco) e José Alves de Lima, o Zezé (bandolim e ganzá).

A apresentação é anunciada nos jornais convidando os leitores “a ouvir no Cine Palais a Orquestra Típica Oito Batutas. Última novidade no mundo artístico carioca, no seu admirável repertório de música vocal e instrumental brasileira. Maxixes, lundus, canções sertanejas, corta-jacas, batuques, cateretês etc”. A temporada de estreia dos Batutas é um sucesso, com boa repercussão nos veículos impressos (como o jornal A Rua, que informou que “colossais enchentes” vinham tomando o Palais) e ilustres na plateia, como o grande compositor Ernesto Nazareth, o político Rui Barbosa e o empresário Arnaldo Guinle. Uma reação que destoa é a do jornalista Julio Reis, do já citado A Rua, que se diz “envergonhado” com aquele “escândalo”, ou seja, um conjunto que toca música popular, usa trajes nordestinos e ainda por cima tem quatro negros em sua formação: Pixinguinha, Donga, China e Nelson Alves.

Para o bem do conjunto, prevalecem reações como a de Arnaldo Guinle, milionário que passa a contratar os Oito Batutas para se apresentarem nos saraus em sua mansão, no bairro de Laranjeiras – mansão que hoje é conhecida como Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador do estado do Rio de Janeiro. É Guinle quem propõe aos Oito Batutas uma empreitada ambiciosa: viajar em turnê pelo Brasil fazendo apresentações musicais e também recolhendo ritmos do folclore brasileiro a serem catalogados a cada cidade em que chegassem. Patrocinados pelo magnata (que conta com a parceria do escritor Coelho Netto), os Oito Batutas partem em sua turnê expedicionária em outubro de 1919, começando pelo estado de São Paulo, onde Pixinguinha e companhia (reforçados pelo violonista João Pernambuco) se apresentam primeiro na capital e depois em Santos, Ribeirão Preto e Cravinhos.

1920

1920

Em janeiro, os Oito Batutas dão prosseguimento a sua expedição musical em Minas Gerais, com recitais em Belo Horizonte e duas cidades do interior: São João da Boa Vista e Poços de Caldas. Além dos shows para as plateias mineiras, o ano dos Oito Batutas será marcado por duas temporadas teatrais. A primeira delas se inicia em 16 de junho, no São Pedro (antigo nome do atual João Caetano), como atração da opereta sertaneja Flor tapuia, que tem libreto de Alberto Deodato e Danton Vampré, música de Luís Quesada e um elenco estelar que conta com Abigail Maia, Procópio Ferreira (pais de Bibi Ferreira), Vicente Celestino e Jaime Costa, entre outros. O conjunto será atração também da revista Se a bomba arrebenta, apresentada no fim do ano no Teatro Recreio.

1921

1921

Após o carnaval, os Oito Batutas retomam a turnê expedicionária, agora rumo ao Nordeste. Suas apresentações se dão em Salvador e Recife – onde são elogiados com entusiasmo pela crítica pernambucana. A viagem é a última dos Oito Batutas dentro da empreitada proposta e patrocinada por Arnaldo Guinle, encerrada aqui sem deixar rastro sobre o encaminhamento ou o paradeiro do material recolhido em campo pelos Oito Batutas. Assim, não se sabe se as turnês expedicionárias tiveram algum desdobramento prático, além da provável influencia das novas sonoridades sobre a música que já era feita pelos integrantes do conjunto, como Donga e Pixinguinha.

Outro marco de 1921 se dá no dia 3 de outubro, quando os Oito Batutas se apresentam na residência do presidente da República, Epitácio Pessoa, como atração na recepção oferecida ao general francês Charles Mangin, herói da Primeira Guerra Mundial. Um dos mais entusiasmados com a performance do conjunto de Pixinguinha no evento é o general Cândido Rondon.

1922

1922

No dia 19 de janeiro, os Batutas embarcam no navio transatlântico Massília rumo à França, aonde chegam em 11 de fevereiro, com desembarque no porto de Bordeaux. Nos meses seguintes, eles seriam atração fixa numa badalada casa noturna de Paris, o dancing Sheherazade, cujo diretor artístico, o dançarino brasileiro Duque (o soteropolitano Antônio Lopes de Amorim), era o responsável pelo convite ao conjunto, que aliás precisou adaptar seu nome especialmente para a viagem. O motivo foi o desfalque de última hora do baterista J. Tomás, que adoece às vésperas do embarque e faz que os Oito Batutas viajem com apenas sete componentes: Pixinguinha, Donga, Nelson dos Santos Alves, China, Sizenando Santos (o Feniano), José Monteiro e José Alves de Lima.

 

 

Contrastando com o sucesso das apresentações junto ao público e à imprensa parisiense (que se referem ao conjunto como Les Batutas ou L’Orchestre des Batutas), na imprensa brasileira destacam-se os textos de teor racista a respeito da atuação de Pixinguinha e companhia. Como o Diário de Pernambuco, em cujas páginas o jornalista A. Fernandes se diz preocupado com a possibilidade de virarmos piada entre os franceses: “Seja como for, o boulevard vai se ocupar de nós. Não do Brasil de Arthur Napoleão, de Osvaldo Cruz, de Rui Barbosa, de Oliveira Lima, não do Brasil expoente, do Brasil elite, mas do Brasil pernóstico, negróide e ridículo e de que la chanson oportunamente tomará conta.” Já o Jornal do Commercio, também do Recife, descreve os Batutas como “oito, aliás, nove pardavascos que tocam violas, pandeiros e outros instrumentos rudimentares” e lamenta “não haver uma política inexorável que, legalmente, os fisgasse pelo cós e os retirasse de bordo com a manopla rija, impedindo-lhes a partida no liner da Mala Real!”.

Apesar do desgosto de parte da imprensa brasileira, a estada de seis meses na França – custeada novamente por Arnaldo Guinle – é marcada também por uma apresentação dos Batutas para integrantes da família imperial brasileira, exilada em Paris desde a queda da monarquia no Brasil, em novembro de 1889. A temporada francesa termina no dia 14 de agosto, quando os Batutas desembarcam do navio Lutetia no porto do Rio de Janeiro. Pixinguinha traz na bagagem um saxofone, presente de Arnaldo Guinle.

Durante o mês de setembro, os Batutas fazem apresentações na Exposição do Centenário da Independência, como atração fixa do pavilhão da montadora de automóveis norte-americana General Motors, contando com os reforços da cantora Zaíra de Oliveira e do trompetista Bonfiglio de Oliveira. Algumas fontes de referência informam que, durante esse período, o conjunto participa da primeira transmissão de rádio no Brasil – que tem como marco inicial oficial um discurso do presidente da República, Epitácio Pessoa, realizado no dia 7 de setembro de 1922.

Em 1º de dezembro, o conjunto segue em nova viagem internacional, desta vez para Buenos Aires e com o nome de Oito Batutas, ou seja, formação completa: Pixinguinha (flauta e saxofone), Donga (violão e banjo), J. Tomás (bateria), China (violão e voz), Nelson Alves (cavaquinho e banjo), J. Ribas (piano), Josué de Barros (violão) e José Alves (bandolim e ganzá). Às apresentações na capital portenha (realizadas no Teatro Empire) seguem outras em cidades do interior como Rosário, La Plata e Chivilcoy. O sucesso alcançado pela música dos Oito Batutas pode ser constatado em jornais como o La Razon (edição de 1º de abril de 1923), em cujas páginas pode-se ler um poema – assinado por Musmée – que é dedicado “al flautista Alfredo Viana” e começa com Pixinguinha nas alturas: “Negro, tu tienes dos alas / Y volando por losnidos / Recogistelos sonidos / em caprichosas escalas”.

Desentendimentos com o consulado brasileiro e com produtores locais acarretam em dificuldades financeiras para os integrantes dos Oito Batutas no fim da estada, que termina no mês de abril de 1923.

1926

1926

Na noite de 31 de julho estreia no Teatro Rialto (localizado na Rua da Ajuda, Centro) a revista Tudo preto, encenada pela Companhia Negra de Revistas, com organização do cenógrafo Jaime Silva e do cantor, compositor e ator De Chocolat (autor da revista). A ousadia – encenar uma peça com elenco inteiramente formado por negros – nasce de conversas de De Chocolat com Pixinguinha, em São Paulo, durante uma turnê dos dançarinos Duque e Gaby, como informaria anos depois o cronista Jota Efegê (em O Globo de 26 de outubro de 1972). O mesmo cronista escreve que a temporada de Tudo preto foi um marco: “Os pretos, marginalizados, sem oportunidade nos palcos da cidade, iam, então, mostrar suas qualidades”. Jota Efegê conta em seu texto que todos em cena eram “colored”: tanto os integrantes do elenco (as vedetes Jandira Aimoré, Rosa Negra e Dalva Espíndola, o cômico Mingote, o cantor Covinha, o bailarino Guilherme Flores e o próprio De Chocolat, entre outros) quanto os 20 integrantes da orquestra regida por Pixinguinha, que era também um dos autores das músicas do espetáculo (o outro seria o trompetista Jaime Cirino).

Além do sucesso da empreitada, para Pixinguinha a temporada de Tudo preto tem um significado especial: entre ensaios e sessões, ele começa seu namoro com a vedete Jandira Aimoré (na verdade, Albertina Nunes Pereira). Os dois se casariam em seguida e viveriam juntos até 1972, ano da morte de Betty, apelido (pronunciado com terminação oxítona: Betí) pelo qual era chamada por todos. Apesar de receber algumas críticas preconceituosas (O Malho publica que o teatro tinha que ser equipado com “câmaras inodorantes” e o Jornal do Commercio insinua que a plateia só tinha parentes dos artistas), a temporada é um sucesso, com duração até fins de agosto.

O ano de 1926 marca também o encontro de Pixinguinha com o escritor e pesquisador Mário de Andrade, que procura o músico durante a temporada paulista de Tudo preto (realizada entre outubro e novembro). Mário recolhia material para um livro que estava escrevendo e que seria publicado em 1928, com o título de Macunaíma, o herói sem nenhum caráter. Pixinguinha colabora prestando informações a Mário de Andrade sobre o ambiente da casa de Tia Ciata – terreiro em que se reuniam festeiros e religiosos para festas com candomblé e música variada: tinha samba, tinha choro, maxixe e o que fizesse parte do repertório de seus frequentadores mais assíduos, como Pixinguinha, João da Bahiana, Donga, Sinhô e Bucy Moreira (sobrinho de Tia Ciata), entre outros músicos. As informações municiam Mário na produção do capítulo 7 do livro, intitulado “Macumba” e com personagens como Olelê Rui Barbosa, “um negrão filho de Ogum, bexiguento e fadista de profissão” inspirado em Pixinguinha.

1927

1927

No dia 5 de janeiro, Pixinguinha se casa com Betty. O ano registra ainda o início das atividades dos Oito Batutas no Cinema Odeon (onde acompanham dois casais de dançarinos norte-americanos) e uma turnê do conjunto por cidades de Santa Catarina – na volta ao Rio de Janeiro, Pixinguinha é informado do falecimento de seu irmão e grande amigo Otávio Vianna, o China, aos 37 anos, vítima do rompimento de um aneurisma na aorta.

1928

1928

Sai pela Parlophon o disco 78 rotações (número 12.867) com a primeira gravação de um clássico de Pixinguinha: o choro Lamentos, interpretado pela Orquestra Típica Pixinguinha-Donga. O lado B traz o choro Amigo do povo, de Donga. Ambos caem no gosto popular, mas não da crítica, a julgar pelo comentário de Cruz Cordeiro, que numa edição da revista Phono-Arte classifica o disco como “o pior dos quatro que a Orquestra Pixinguinha-Donga oferece nesta quinzena”, afinal, “a influência das melodias norte-americanas e mesmo do ritmo das músicas norte-americanas é nesses dois choros bastante evidente”, o que “nos causou sérias surpresas, porquanto sabemos que os compositores são dois dos melhores autores da música típica nacional”. O ano de 1928 registra também – a partir de maio – o início das atividades dos Oito Batutas como atração fixa no bar/restaurante Assírius, localizado no subsolo do Theatro Municipal.

Em dezembro, outro disco de 78 rotações da Parlophon (número 12.877) traz a gravação da Orquestra Típica Pixinguinha-Donga para um choro instrumental de Pixinguinha com inusitadas duas partes – uma a menos do que as tradicionais três partes do choro – chamado Carinhoso. Está no lado B do disco que, em seu lado A, traz o maxixe Não diga não, de autoria de Peri. A exemplo do que já tinha feito com Lamentos, o crítico Cruz Cordeiro novamente reprova Pixinguinha, escrevendo assim sobre Carinhoso, na edição de janeiro de 1929 da revista Phono-Arte: “Parece que o nosso popular compositor anda sendo influenciado pelos ritmos e melodias da música de jazz. É o que temos notado desde algum tempo e mais uma vez, neste seu choro, cuja introdução é um verdadeiro foxtrote, que, no seu decorrer, apresenta combinações de pura música popular ianque. Não nos agradou”.

Pelo menos desta vez Cruz Cordeiro poupa o lado A (Não diga não é “realmente ótimo” e “vale o disco”) e está de acordo com o gosto do povo, que não dá a menor repercussão ao lançamento de Carinhoso. A música não faz sucesso nem mesmo com as duas regravações que se sucedem: uma pela Orquestra Victor Brasileira (1929) e outra pelo bandolinista Luperce Miranda (1934).

1929

1929

Ano de lançamento do famoso samba maxixado Gavião calçudo (composição de Pixinguinha com letra de Cícero de Almeida), gravado pelo violonista e cantor Patrício Teixeira (cunhado de Pixinguinha, que vem a ser irmão de Cristodolina, a Nininha, casada com Teixeira). Mais uma vez, o crítico Cruz Cordeiro acha que falta brasilidade a Pixinguinha, como escreve na revista Phono-Arte, edição de fevereiro: “Ouçam Gavião calçudo. Mais parece um foxtrote do que um samba. As suas melodias, os seus contracantos e mesmo que quase que o seu ritmo, tudo respira a música dos ianques”. A crítica negativa seria compensada no mês seguinte, março, quando O Jornal publica uma entrevista com o então jovem Ary Barroso, que assim responde quando perguntado sobre seu compositor preferido: “Em primeiro lugar, o admirável Pixinguinha, o homem das melodias arrebatadoras”.

O ano de 1929 registra também o início das atividades da RCA Victor Talking Machine Company of Brazil no Rio de Janeiro. Nas décadas seguintes, a companhia será uma das grandes gravadoras locais, disputando a liderança das vendagens com a também norte-americana Odeon. Logo no início dessas atividades, a RCA Victor conta em suas gravações com arranjos de Pixinguinha, aprovado num concurso promovido pela gravadora, classificado em primeiro lugar com Carinhoso. O emprego – seu primeiro numa gravadora – vale a Pixinguinha um salário mensal de um conto e duzentos mil-réis.

No novo emprego, Pixinguinha tem as atribuições de escrever arranjos e orquestrações e também de reger a orquestra da gravadora. Segundo o jornalista Sérgio Cabral (Pixinguinha, vida e obra), esta orquestra era, na verdade, uma base que podia ter sua formação instrumental adaptada de acordo com a música a ser gravada: a Orquestra Victor Brasileira ficava com as canções mais lentas; já aos Diabos do Céu eram entregues as músicas carnavalescas, que podiam ser gravadas também pelo Grupo da Guarda Velha – que tocava nas gravações de choros e de músicas de sabor africano. Quando a RCA Victor lançar, em 1936, a sua emissora de rádio, a Transmissora, o diretor artístico da gravadora, Mister Evans, contratará Pixinguinha como flautista e arranjador – tarefa que será dividida com Radamés Gnattali, Iberê Gomes Grosso e Célio Nogueira, entre outros maestros.

O início da atuação de Pixinguinha como arranjador na RCA Victor trouxe, de certa maneira, a solução para um problema que a música popular brasileira – em especial, o samba – enfrentava dentro das gravadoras, onde as orquestras eram geralmente comandadas por maestros estrangeiros que regiam músicos (na maioria) estrangeiros. Estabelecido desde 1917 (ano do lançamento de Pelo telefone), o samba já gozava de grande popularidade e até ganhava nova cadência – mais apropriada para os desfiles de rua – nas mãos dos sambistas do Estácio. Mas as gravações padeciam com a falta de bossa e o resultado era invariavelmente frio: ouvia-se muito pouco samba nas gravações de samba.

A atuação de Pixinguinha fazendo arranjos e orquestrações seria fundamental para fazer o samba soar como samba, como define o jornalista Sérgio Cabral: “Pixinguinha abrasileirou as orquestrações de forma tão nítida e radical que se pode dizer, sem qualquer medo de errar, que foi ele o grande pioneiro da orquestração para a música popular brasileira. A canção carnavalesca deve a ele uma boa parcela do seu êxito, ao escrever arranjos com destacada participação da orquestra, criando introduções que ficaram famosas (como a de O teu cabelo não nega, por exemplo) e encontrando soluções inventivas para as músicas mais simples, ao utilizar muito bem a percussão e ao variar na base das modulações”.

O time de músicos escalado por ele para as novas gravações tinha alguns dos melhores instrumentistas do país, entre eles Luís Americano (clarinete e sax), Bonfiglio de Oliveira (pistom), Luperce Miranda (bandolim e cavaquinho), Donga (violão, banjo e cavaquinho), Luciano Perrone (bateria), Augusto Vasseur (piano), João da Bahiana (percussão) e Esmerino Cardoso (considerado o pai do trombone brasileiro). Com estes instrumentistas e mais os arranjos de Pixinguinha, haveria bossa pra dar e vender em músicas como, por exemplo, a marchinha Pra você gostar de mim (Taí), composição do médico Joubert de Carvalho que seria gravada no início de 1930 (precisamente no dia 27 de janeiro) para se tornar um dos maiores sucessos daquele carnaval e também o primeiro sucesso de Carmen Miranda.

1930

1930

Mesmo com todos os trabalhos como instrumentista e arranjador/orquestrador, Pixinguinha ainda encontra tempo para compor. E, neste ano de 1930, um dos destaques de sua obra de compositor é Os home implica comigo: samba brejeiro de Pixinguinha em parceria com… Carmen Miranda, na primeira das únicas duas incursões musicais assinadas pela cantora, que faz a gravação em 21 de junho de 1930, na RCA Victor.

Entre as composições de Pixinguinha lançadas nesse ano está um outro clássico de seu repertório, o choro Segura ele. Também dignos de nota são a gravação que Pixinguinha faz do choro O urubu e o gavião (cujo tema deriva do famoso Urubu malandro, de Lourival de Carvalho, o Louro) e seu arranjo para a música Babaô miloquê, composição de Josué de Barros (também intérprete da gravação) que é identificada como “macumba” no selo do disco da Victor em que foi lançada.

1931

1931

O ano registra o fim das atividades dos Oito Batutas no bar/restaurante Assírius. A partir da mesma base, Pixinguinha, Donga e João da Bahiana criam o conjunto que será uma das atrações do carnaval de 1932 e com o qual farão muitas gravações daqui por diante: o Grupo da Guarda Velha. Pixinguinha, Donga e João da Bahiana ainda não têm idade para serem considerados “guarda velha” (Pixinguinha está com 34 anos, Donga tem 41 e João, 44), mas o nome escolhido deixa claro que eles, nesta empreitada, estão comprometidos com a música tradicional brasileira.

Uma das gravações iniciais do Grupo da Guarda Velha é a da chula raiada Patrão, prenda seu gado, parceria do trio Pixinguinha, Donga e João da Bahiana que sai nesse ano de 1931 em um disco de 78 rotações (número 33492) lançado pela Victor.

1932

1932

Entre as gravações do Grupo da Guarda Velha estão músicas que remetem à religiosidade afro-brasileira, como por exemplo Xou curinga, composição de João da Bahiana gravada neste ano na Victor, tendo Francisco Sena como solista e acompanhamento da Guarda Velha. Com arranjo de Pixinguinha, a música é identificada no selo como “macumba” e merece comentários de Mário de Andrade nas anotações que fazia no papel pardo que envolvia os discos – e que seriam compiladas em publicações como o Dicionário da música brasileira, editado pela professora Flávia Camargo Toni, do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (USP). Sobre Xou curinga, Mário comenta que se trata de um “Mi maior completo”, que é uma “delicia de orquestração” e que o “tema parece influenciado”.

1933

1933

Seguindo os conselhos de amigos, Pixinguinha encontra espaço em sua agenda lotada – como instrumentista, arranjador, diretor de orquestras… – para se dedicar aos estudos de teoria musical – embora já fosse um nome importante da música popular brasileira. Assim, ele frequenta as aulas no Instituto Nacional de Música (atual Escola de Música da UFRJ), entre março e outubro, quando recebe o certificado de conclusão do curso de Teoria Musical das mãos do diretor da escola, o pianista e musicólogo mineiro Guilherme Fontainha.

Outro marco importante do arranjador Pixinguinha nesse ano é o lançamento da famosa marcha junina Chegou a hora da fogueira – composição de Lamartine Babo que sai pela RCA Victor com arranjo de Pixinguinha e gravação de Carmen Miranda e Mário Reis, acompanhados pela Orquestra Diabos do Céu. Um dos elogios enfáticos e célebres àquele arranjo parte de Orestes Barbosa, que escreve assim na edição de 9 de agosto de 1933 do jornal A Hora: “Pixinguinha! É hoje o orquestrador mais perfeito dos discos da cidade. O Chegou a hora da fogueira tem um pedaço em que a música sobe e o povo sente mesmo o balão subindo, na sua vertigem pomposa. O balão e os foguetes. Não precisa de libreto para explicar. Sabendo música de pagode, Pixinguinha tem contra si a falta de cabeleira do Villa-Lobos”.

No livro Pixinguinha, vida e obra, o jornalista Sérgio Cabral afirma que em 1933 seu biografado “trabalhou o ano inteiro no Eldorado”, isto é: o dancing Eldorado, que funcionava onde – já nos anos 2000 – passaria a funcionar o Centro Cultural Carioca, num sobrado da Praça Tiradentes. O também compositor e arranjador Radamés Gnattali conta – em aspas publicadas em seu sítio oficial – que lá viu pela primeira vez Pixinguinha tocando: “Conheci Pixinguinha tocando no dancing Eldorado na Praça Tiradentes, na década de 30. Era uma pequena orquestra de jazz, como muitas da época. No piano, Centopéia, extraordinário. No ganzá, Vidraça. Eles faziam uma sessão de choro, e eu ali, aprendendo”.

1934

1934

Embora o trabalho nas gravadoras siga a todo vapor, o ano de 1934 marca o início de mais uma frente profissional na agenda de Pixinguinha: ele entra para o serviço público, sendo nomeado fiscal do Serviço de Limpeza Urbana pelo prefeito do Distrito Federal, Pedro Ernesto. O cargo esdrúxulo para o músico tem uma explicação: Pedro Ernesto deseja que Pixinguinha esteja à frente da organização da banda da Guarda Municipal, só que a função de “maestro de banda” não existe nos quadros administrativos da Prefeitura. Assim, nosso maestro é contratado com o cargo de fiscal do Serviço de Limpeza Urbana, do qual seria transferido para a Secretaria de Viação e Obras Públicas e, depois, passaria a professor da rede municipal de ensino. A muito custo, a banda acaba sendo formada, mas sem o entusiasmo de Pixinguinha, tamanha a falta de comprometimento dos “músicos” que se apresentaram para tocar sob seu comando.

1935

1935

No oitavo ano de casamento, Betty e Pixinguinha adotam um menino, que é registrado como filho do casal e recebe o nome de Alfredo da Rocha Vianna Neto.

1936

1936

O carteiro e músico amador Alexandre Gonçalves Pinto – conhecido pelo apelido de Animal – lança o livro O choro: reminiscência dos chorões antigos, no qual faz um levantamento precioso de locais e personagens importantes do choro no Rio de Janeiro desde fins do século 19. Entre os chorões descritos pelo Animal está, por exemplo, o pai de Pixinguinha, Alfredo Vianna: “Melodioso flauta que podia se comparar com os acima descritos. Tocava de primeira vista, a princípio na sua flauta amarela, de cinco chaves, e ultimamente em uma de novo sistema. Deixou ele um grande arquivo de músicas antigas e modernas que deve achar-se em poder de seu filho Pixinguinha, maestro e talentoso flauta que repercutiu as nossas glórias musicais no estrangeiro…”.

Outro nome incluído entre os velhos chorões inventariados pelo Animal é o de China: “…era também filho do velho chorão Alfredo Vianna e irmão dos glorificados músicos Pixinguinha e Léo. China era violão afamado, o instrumento nos seus dedos era de maravilhar. Não só acompanhava muito bem, como também era solante de extasiar. Tinha uma garganta de ouro, pois nos ‘cabarets’ onde se exibia era muitíssimo aplaudido pelos circunstantes, que viam nele um batuta respeitado. Tinha uma voz de barítono de encantar…”. Há também um verbete dedicado a Léo Vianna: “As melodias feitas com a sua flauta encantavam a todos que o ouviam. Deixando depois a flauta, dedicou-se ao violão, tornando-se um batuta, não respeitando os seus congêneres. Cavaquinho na sua mão é sopa, não só acompanha como sola as músicas antigas e modernas admiravelmente”.

1937

1937

No mês de julho, o cantor Orlando Silva relança pela RCA Victor o choro Carinhoso, agora com letra de João de Barro – os versos estavam prontos desde o ano anterior, quando foram feitos para serem cantados por Heloísa Helena no espetáculo beneficente Parada das maravilhas, promovido pela primeira dama Darcy Vargas no dia 10 de outubro de 1936, no Theatro Municipal, para arrecadar fundos para a obra social Pequena Cruzada. Heloísa Helena estava sem uma música inédita para apresentar no espetáculo e recorreu a João de Barro, que por sua vez se lembrou do antigo choro de Pixinguinha e foi procurá-lo no dancing Eldorado. Pixinguinha, então, tocou o choro repetidamente na flauta, até que fosse decorado por João de Barro, que fez a letra em seguida. O jornalista Sérgio Cabral (Pixinguinha, vida e obra) conta que, antes da letra de João de Barro, Carinhoso já tinha recebido letra do paulista Bernoit Certain (autor de marchinhas e futuro prefeito da cidade de Jundiaí), mas que esta não tinha agradado Pixinguinha.

Voltando à gravação de Orlando Silva, é importante informar que o disco da Victor em que ela foi lançada (disco de 78 rotações com o número de 34.181) trazia no lado B a gravação de Orlando para outro grande sucesso de Pixinguinha: a valsa Rosa, coassinada por Otávio de Souza. Rosa era uma versão adaptada e letrada de uma composição de Pixinguinha que – a exemplo de Carinhoso – já existia havia aproximadamente uma década, com o nome de Evocação. Quanto à letra, atribuída a Otávio de Souza (que seria um mecânico de carros do Engenho de Dentro), há quem suspeite de que ela, na verdade, tenha sido feita por Cândido das Neves.

De volta ao Carinhoso, vale registrar que, com mais de 400 regravações, ele se firmaria como um dos maiores clássicos da música popular brasileira, tendo obtido a primeira colocação em uma seleção – 30 músicas do século XX – realizada pela Rede Globo no ano 2000 (ficou, contudo, atrás do samba-exaltação Aquarela do Brasil, de Ary Barroso, eleito hors-concours).

Outro fato marcante de 1937 é a contratação de Pixinguinha para trabalhar na Rádio Mayrink Veiga como flautista, arranjador e regente. Nessa época, ele passa a se apresentar em um quinteto formado com Arthur de Souza Nascimento, o Tute (violão de sete cordas), José Valeriano (violão de seis cordas), Luperce Miranda (cavaquinho e bandolim) e João da Bahiana (pandeiro). A formação servirá de ponto de partida para Pixinguinha compor um clássico de seu repertório: o belo choro Cinco companheiros, que será gravado pelos próprios em 1940, na Odeon.

1938

1938

É lançado pela RCA Victor, no disco de 78 rotações de número 34.346, o lundu Yaô (composição de Pixinguinha em parceria com Gastão Vianna), que sai com o título de Yaou africano e tem como intérprete o cantor Patrício Teixeira. Repleta de palavras de “origem africana”, a letra pode ser vista como um exemplo do linguajar dos negros que vigorou no Rio de Janeiro do início do século 20, como um verdadeiro dialeto remanescente dos tempos de escravidão. A música será regravada em 1968, com o nome de Yaô, no LP Gente da antiga, sendo apresentada assim no texto do encarte, que é assinado pelo produtor do disco, Hermínio Bello de Carvalho: “Segundo Pixinguinha, Gastão Vianna gostava de fazer sambinhas afro-brasileiros, com palavras africanas. João da Bahiana, que sola o número, é quem explica: ‘yaô’ são as filhas de santo do terreiro. ‘Aquicó’ é o galo, ‘peru adié’, a galinha. Isso quer dizer: o galo com as galinhas no terreiro faz inveja para os rapazes solteiros. ‘Jacutá de preto velho’: casa de babalaô. Oxóssi é São Sebastião. Vamos saravá Xangô, vamos saudar São Jerônimo”.

1939

1939

Na trajetória de Pixinguinha, o principal acontecimento desse ano faz parte de sua vida pessoal: é quando ele adquire uma casa no bairro de Ramos, mais precisamente na Rua Belarmino Barreto, nº 23. Para se livrar de uma vez por todas do aluguel, Pixinguinha faz um acordo para pagar pela casa um montante de 35 contos de réis, com uma entrada de cinco contos e o restante a ser pago a prestação. Outra nota de 1939 é o roubo de sua primeira flauta, que se dá na chapelaria do Clube Municipal (na Tijuca), durante um momento de desatenção de Pixinguinha.

1940

1940

O ano é marcado por duas mortes de pessoas próximas a Pixinguinha: a primeira, em 5 de maio, é a do trompetista Bonfiglio de Oliveira. A segunda, em julho, é de sua mãe, D. Raimunda.

No campo artístico, um dia importante é o 7 de agosto, quando chega ao Rio de Janeiro, a bordo do navio Uruguay, o maestro inglês Leopold Stokowski, para comandar a sua All American Youth Orchestra em dois concertos no Theatro Municipal. O maestro aproveita a estada no Rio de Janeiro para recolher material local com vistas ao Congresso Pan-Americano de Folclore e, assim, pede ajuda a Heitor Villa-Lobos para arregimentar artistas que pudessem gravar exemplares da mais autêntica música brasileira.

Entre os artistas arregimentados estão Donga, o compositor mangueirense Cartola, o pai-de-santo Zé Espinguela, o instrumentista Luís Americano, o comediante Jararaca e Pixinguinha, que além de tocar flauta também canta em algumas das 40 gravações que são feitas em um estúdio completo montado dentro do grande salão do transatlântico. Das 40 gravações feitas a bordo, apenas dezessete são selecionadas para serem lançadas comercialmente nos Estados Unidos, no álbum Brazilian native music, que sai pela gravadora Columbia. Pixinguinha toca sua flauta nas gravações de Pelo telefone, Que querê quê quê, Caboclo do mato e Ranchinho desfeito, entre outras. Já a sua voz pode ser ouvida na música Zé Barbino, que ele canta em dueto com Jararaca, seu parceiro na composição.

1941

1941

Uma das músicas de carnaval premiadas no concurso anual da Prefeitura do Distrito Federal é a marchinha Alá-la-ô, composição de Haroldo Lobo e Nássara gravada por Carlos Galhardo na Victor com grande arranjo de Pixinguinha. Em depoimento ao jornalista Sérgio Cabral, Nássara divide com o arranjador os louros pelo sucesso da marcha: “Sem o grande Pixinguinha, minha música não seria o que é. Alá-la-ô teve um parceiro oculto, de gênio”. Também segundo Sérgio Cabral (Pixinguinha, vida e obra), o momento é marcado por sérias dificuldades na vida de seu biografado: “Pixinguinha viveu uma fase difícil na primeira metade da década de 1940, em decorrência da bebida. Deixou a Rádio Mayrink Veiga, sumiu de circulação, quase não se falava dele. Tratava-se de um alcoólatra”, descreve o jornalista e escritor, que mais adiante revela outro problema sério surgido no período: “Trabalhando pouco e gastando muito com o álcool, começou a atrasar o pagamento das prestações da casa”. Sua dívida cresce e ele passa a ser ameaçado de perder a casa em que vive com Betty e Alfredinho.

1942

1942

Ano de lançamento das últimas gravações de Pixinguinha tocando flauta, num disco de 78 rotações (número 12.151) da Odeon, com as faixas Chorei (no lado A) e Cinco companheiros (no B). Daqui por diante, só tocará saxofone tenor em suas gravações e apresentações, numa transição de instrumentos que motivou diversas especulações, nenhuma delas confirmadas pelo próprio Pixinguinha: ele teria perdido a embocadura por conta de problemas dentários ou então estaria com as mãos trêmulas (em decorrência do alcoolismo) e já não manejava a flauta com a mesma precisão. No livro Pixinguinha, vida e obra, o biógrafo Sérgio Cabral cita uma crônica de Henrique Pongetti – usando o pseudônimo Jack – publicada no jornal O Globo (em fevereiro de 1944) na qual ele conta que Pixinguinha, num sarau em Botafogo onde insistiam para que tocasse flauta, explicou assim a troca de instrumentos: “Um dia, cismei que não tocava mais como queria. Comecei a ter medo. Medo de que notassem os defeitos que eu notava na minha execução”.

Um personagem fundamental para Pixinguinha nesse momento de grande dificuldade é o flautista e compositor Benedito Lacerda, que propõe a Pixinguinha um modo de voltar à rotina de trabalho e remunerações. É Benedito quem consegue, com a editora Irmãos Vitale, o valor necessário para Pixinguinha quitar a dívida que se acumulava com as prestações vencidas. O dinheiro é obtido como adiantamento pelos discos que seriam feitos na RCA Victor pela nova dupla: Benedito na flauta, Pixinguinha no sax tenor – Sérgio Cabral informa que o acordo com a gravadora previa 25 discos, mas o total de discos lançados pelo dueto são 17 (ou seja, 34 fonogramas). O acordo previa ainda que Benedito Lacerda seria parceiro de Pixinguinha em todas as músicas que gravassem, mesmo naquelas compostas por Pixinguinha antes do encontro deles, como Um a zero, Sofres porque queres e Oito Batutas, entre outras. Trato aceito por Pixinguinha, que não só voltaria à ativa, como saldaria as prestações que devia.

“Se Pixinguinha fez ou não um bom negócio, só os especialistas em transações financeiras poderão dizer”, afirma o jornalista Sérgio Cabral (em Pixinguinha, vida e obra). “Mas que a música brasileira foi enriquecida por algumas das melhores gravações de choro de todos os tempos, isso foi. Benedito foi um flautista admirável e Pixinguinha, com os contrapontos mais requintados, aperfeiçoando o que ouvira desde menino no oficleide de Irineu de Almeida, abriu novos caminhos para a música instrumental brasileira.”

“A ideia da dupla Pixinguinha e Benedito Lacerda foi do Benedito, porque o Pixinguinha já estava esquecido, ninguém mais falava nele”, conta o cavaquinista Canhoto em depoimento publicado no livro Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento (Marília Trindade Barboza e Arthur de Oliveira Filho), antes de revelar que todas as gravações da dupla seriam feitas de bossa, ou seja: sem partitura. “As músicas eram só do Pixinguinha. E o Benedito combinou com ele: fazia os discos, mas entrava nas parcerias. Muitas pessoas meteram o pau no Benedito, mas não tinham razão. Ele foi franco”.

1945

1945

Em julho, Pixinguinha é convidado pelo radialista, compositor e cantor Almirante a assinar contrato com a emissora de rádio mais popular do país: a Rádio Nacional. No entanto, o radialista entra em rota de colisão com a Nacional e, em julho de 1946, se transfere para a Rádio Tupi, levando Pixinguinha junto com ele. A nova casa hospedará um programa de Almirante que terá Pixinguinha como atração.

1946

1946

Em maio, chega à lojas o disco Victor do conjunto vocal Anjos do Inferno trazendo a primeira gravação do lundu Benguelê, parceria de Pixinguinha com Gastão Vianna gravada no dia 26 de março. São dignas de nota as falas dos integrantes do conjunto no início da gravação (“Viva o povo de umbanda!”, “Viva o povo de todas as linhas!”, “Deus é grande, meu fio!”), dando a ambiência que talvez tenha faltado na sonoridade do arranjo. O mesmo não se pode dizer da gravação mais conhecida de Benguelê, realizada por Clementina de Jesus no LP Rosa de ouro, lançado em 1965 com o registro do espetáculo homônimo produzido naquele ano por Hermínio Bello de Carvalho, no Teatro Jovem, em Botafogo.

Em setembro, sai o primeiro disco contendo gravações do dueto de Pixinguinha com Benedito Lacerda: um 78 rotações da Victor (de número 80-0442) trazendo os choros Um a zero (no lado A) e Sofres porque queres (no B), ambos de Pixinguinha – coassinados por Benedito. Ainda nesse ano, a Victor lançará mais dois discos do duo: um em outubro (o de número 80-0447, contendo os choros Naquele tempo e Segura ele) e outro em novembro (o de número 80-0458, com os choros Vou vivendo e Cheguei).

Houve quem lamentasse que o reaparecimento de Pixinguinha se desse não mais como solista, mas num dueto no qual o protagonismo seria dividido com outro músico. Mas o que se constatou, logo que saíram os primeiros discos, foi que o talento de Pixinguinha continuava à toda no dueto, no qual criou um tipo de contraponto musical que, segundo o pesquisador Brasílio Itiberê, “é um dos elementos mais complexos e de maiores consequências estéticas que existe na música popular brasileira”. Nos discos do dueto – que sairão até o início de 1951 – estão as primeiras gravações de alguns clássicos do repertório de choro, como O gato e o canário, Ele e eu e Ingênuo, este último o choro que Pixinguinha dizia ser seu preferido.

1947

1947

Em 8 de outubro, estreia na Rádio Tupi o programa O pessoal da Velha Guarda, criado por Almirante (roteirista e apresentador), tendo como figura central Pixinguinha – que atua como diretor musical e instrumentista de dois dos três conjuntos que se intercalam durante os 30 minutos do programa: a Orquestra do Pessoal da Velha Guarda (que executa arranjos de Pixinguinha, regida por ele) e o dueto com Benedito Lacerda, que se apresenta acompanhado pelo regional de Benedito: Dino (violão de sete cordas), Meira (violão de seis cordas), Canhoto (cavaquinho), Gilson (pandeiro) e Pedro da Conceição (percussão). O terceiro conjunto é o Grupo de Chorões, que, além de tocar choros, acompanha cantores convidados. Com repertório que alternava músicas da virada do século 19 para o 20 (entre polcas, maxixes e schottisches) e choros prestes a serem lançados em disco (interpretados por convidados como Jacob do Bandolim), O pessoal da Velha Guarda vai ao ar semanalmente por cinco anos, até 1952.

1948

1948

No dia 11 de agosto, Pixinguinha paga a última prestação de sua casa, quitando a dívida que havia contraído em 1939. A biografia Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento (Marília Barboza e Arthur de Oliveira Filho) informa que nesse ano “Pixinguinha teve seu primeiro problema cardíaco, sem maiores consequências”.

1950

1950

Pixinguinha regrava o lundu Yaô (composição sua com Gastão Vianna), como cantor, acompanhado pelo regional de Benedito Lacerda. A gravação sai pela RCA Victor.

1951

1951

Benedito Lacerda e seu regional deixam a Rádio Tupi e são substituídos no programa O pessoal da Velha Guarda pelo regional de Rogério Guimarães, que seguirá como conjunto fixo do programa até as últimas edições, em 1952. Pois é ao lado de Benedito e Almirante que Pixinguinha excursiona nesse ano por cidades do Nordeste (Fortaleza e Recife) e do Norte (Manaus).

Na biografia Pixinguinha, vida e obra, o jornalista Sérgio Cabral informa que nessa época Pixinguinha encontrava-se dando aula de música na Escola Municipal Vicente Licínio Cardoso (na Saúde), mas que oficialmente era “oficial administrativo” (situação que foi corrigida em 2 de outubro, quando Pixinguinha foi nomeado “professor de música e de canto orfeônico, padrão J, do quadro permanente da Prefeitura do Distrito Federal”). Outra instituição de ensino que contou com Pixinguinha – como professor de música e regente de banda – foi a Escola Estadual João Alfredo (antigo Asilo dos Meninos Desvalidos).

1953

1953

No mês de março, Pixinguinha começa a frequentar aquele que será seu “escritório” de todos os dias até a morte: o bar Gouveia, que tem o nome oficial de Whiskeria Gouveia e fica na galeria do Edifício dos Empregados no Comércio, na Travessa do Ouvidor (Centro). Quem o apresenta ao bar é seu cunhado, o cantor e violonista Patrício Teixeira, como o próprio Pixinguinha conta nas páginas da biografia Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento, de Marília Barboza e Arthur de Oliveira Filho: “Fui tomar um negócio e fui ficando acostumado, porque não gosto de ficar mudando de ponto”, relata o frequentador mais ilustre do bar. “O velho Gouveia tinha um armazém na frente, depois foi se modificando. Parece até emprego. Você chega lá e me encontra. Na época da cachaça, eles não me cobravam nada”. Já a biografia escrita por Sérgio Cabral detalha a rotina de Pixinguinha, para quem o Gouveia “se transformaria numa espécie de segundo lar, pois, até a véspera de sua morte, de segunda a sexta-feira, lá estava ele, das 10 às 13 horas, religiosamente”.

1954

1954

No dia 23 de abril, uma sexta-feira, o 57º aniversário de Pixinguinha é comemorado com um programa especial produzido e apresentado por Almirante na Rádio Record de São Paulo. A transmissão marca a abertura do I Festival da Velha Guarda, evento idealizado por Almirante, co-produzido por ele com o Grupo Record e incluído nas comemorações do IV Centenário de São Paulo. No dia seguinte, o Festival prossegue com a apresentação de Pixinguinha e Velha Guarda no Teatro Arthur Azevedo, com transmissão ao vivo pela Rádio Record.

No domingo, dia 25 de abril, o I Festival da Velha Guarda é encerrado com um grande show no Parque do Ibirapuera, com Pixinguinha, Almirante e a Velha Guarda, ou seja: Donga, João da Bahiana, Alfredinho do Flautim, Caninha, Patrício Teixeira, Bide da Flauta, Léo Vianna, Jacob Palmieri, Bororó e Benedito Lacerda, entre outros músicos (como o violonista Baden Powell, então com 16 anos), além das participações dos paulistas Paraguassu e Januário de Oliveira. A apresentação, transmitida ao vivo pela TV Record de São Paulo, é filmada pelo fotógrafo húngaro Thomaz Farkas e mais tarde vai integrar um documentário que poderá ser visto no sítio virtual do Instituto Moreira Salles.

Com o sucesso do Festival, a Rádio Record viabiliza a permanência de Almirante, Pixinguinha e a Velha Guarda em São Paulo durante o mês de maio, quando a emissora abre um horário em sua programação para Almirante apresentar edições especiais do programa O pessoal da Velha Guarda, produzido e apresentado por ele na Rádio Tupi, entre 1947 e 52.

1955

1955

Em abril, realiza-se em São Paulo o II Festival da Velha Guarda, novamente com eventos transmitidos pelas emissoras da Record de São Paulo e, desta vez, com uma programação de quatro dias – o último deles dedicado a outro grande show no Parque do Ibirapuera. Mais badalada do que o ano anterior, a segunda edição conta com outros convidados de peso trazidos do Rio de Janeiro, como os pianistas Radamés Gnattali e Carolina Cardoso de Menezes, o violonista Dilermando Reis, as irmãs Linda e Dircinha Batista e os cantores Augusto Calheiros e Gilberto Alves, entre outros grandes cartazes.

Em julho, o Grupo da Velha Guarda é atração do espetáculo O samba nasce no coração, produzido por Zilco Ribeiro e dirigido por Lúcio Rangel na boate Casablanca, na Praia Vermelha (Urca). Além de Pixinguinha e sua turma, o show tem como atrações os compositores Ismael Silva e Ataulpho Alves e vedetes de destaque, como Consuelo Leandro, Carmem Verônica e Anilza Leoni.

Em 11 de junho, são gravadas em uma única sessão as sete faixas do LP de 10 polegadas A Velha Guarda, que sai nesse ano pela Sinter e tem na formação Pixinguinha (sax), João da Bahiana, Alfredinho (flautim), dois Bides (um na flauta – Alcebíades Pereira da Costa, o Bide da Flauta –, outro na percussão – Alcebíades Barcellos, parceiro de Armando Marçal), Donga, Rubem Bergman, Mirinho e Carlos Lentini (violões) e Waldemar (cavaquinho), além das participações vocais de Almirante e J. Cascata. A capa traz todos os participantes do disco caricaturados por Lan e o texto de apresentação é assinado por Lúcio Rangel: “Os músicos foram deixados à vontade, tocando como costumam tocar em seus choros e nas suas festas suburbanas, não faltando nem mesmo a ‘branquinha’ inspiradora”.

1956

1956

Em 30 de maio, a Rua Belarmino Barreto, em Ramos, onde Pixinguinha vivia com Betty desde 1939, é rebatizada com o nome de Rua Pixinguinha, por iniciativa do político Odilon Braga, um dos fundadores da União Democrática Nacional (UDN). A festa de inauguração da placa tem direito a um palanque montado em frente à casa de Pixinguinha e discursos como o do prefeito do Rio de Janeiro, Francisco Negrão de Lima, que depois se aventura bebendo cachaça e tentando tocar pandeiro. No meio de toda a confusão, a placa desaparece (feito que depois seria reivindicado pelo pesquisador Lúcio Rangel, com sua mania de colecionar objetos dos grandes nomes da música brasileira). Foi preciso encomendar uma segunda, que seria afixada no muro com os dizeres “Rua Pixinguinha (musicólogo)”. Não se sabe quem foi responsável por qualificar Pixinguinha como “musicólogo”, mas é provável que a pessoa tenha tomado essa decisão (equivocada) por achar que ela daria mais status ao homenageado do que chamá-lo de “músico”, ou “arranjador”, ou “compositor”.

O ano é marcado ainda pelo lançamento, através da gravadora Sinter, do LP de 10 polegadas Pixinguinha e sua banda em carnaval de Nássara, com um total de 13 composições do homenageado divididas em duas sequências musicais arranjadas por Pixinguinha – uma no lado A, outra no B.

1957

1957

Saem pela Sinter os LPs Assim é que é… Pixinguinha e sua banda em polcas, maxixes, choros e Pixinguinha e sua banda, sendo o segundo inteiramente dedicado ao repertório junino (trazendo na capa Pixinguinha com chapéu de palha tipo “caipira”).

Em 27 de novembro, Pixinguinha conhece o compositor e trompetista norte-americano Louis Armstrong, num almoço no Palácio Laranjeiras oferecido pelo presidente da República, Juscelino Kubitschek. Após a refeição, o músico de jazz posa para fotografias ao lado de Pixinguinha, JK e todos os outros presentes ao evento: Dorival Caymmi, Ary Barroso, João de Barro, Herivelto Martins, Lamartine Babo e Ataulpho Alves, entre outros grandes artistas brasileiros.

1958

1958

No dia 16 de fevereiro, morre aos 55 anos incompletos o flautista Benedito Lacerda, vítima de câncer de pulmão.

Já Pixinguinha, após sofrer uma crise cardíaca (no dia 29 de janeiro), felizmente contornada pelos médicos, se converte à Igreja Evangélica, seguindo a esposa Betty, recém-convertida. A entrada de Pixinguinha na nova religião é marcada pela doação que ele faz de uma imagem de São Jorge (imagem antiga que lhe fora dada de presente pela casa O Dragão) à igreja de São Geraldo, em Olaria. “Se há religião, eu sou religioso. Respeito todas elas. Agora, cada um tem o seu modo de pensar. No fim se resume a uma coisa só”, opina Pixinguinha no depoimento ao MIS, conforme publicado por Marília Trindade Barboza e Arthur de Oliveira Filho (Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento), que aliás resumem assim a história da relação de Pixinguinha com Deus: “Fora macumbeiro na juventude. Católico na maturidade, tocando órgão nas bodas de prata. Na velhice, protestante”. Pixinguinha chega a dar um tempo nas idas ao Gouveia, mas logo retoma sua rotina boêmia.

Um dos lançamentos da Sinter mirando o carnaval é o LP de 10 polegadas Marchinhas carnavalescas de João de Barro e Alberto Ribeiro, gravado em 1957 com 12 músicas agrupadas em duas grandes sequências musicais (uma no lado A, outra no lado B) arranjadas por Pixinguinha. Também pela Sinter, sai nesse ano de 58 o disco 5 companheiros – Pixinguinha e os chorões daquele tempo, que são o clarinetista Abel Ferreira, o flautista Pedro Vieira, o trombonista Orlando Silva Leite e o violonista Irany Pinto. O LP será relançado em 1968, pelo selo Fontana.

 

Entre os vários shows realizados por Pixinguinha com a Velha Guarda, destaca-se o que eles fizeram na recepção à seleção brasileira de futebol após a conquista da primeira Copa do Mundo, na Suécia. Nos bastidores da apresentação, dar-se-ia o primeiro encontro de Pixinguinha com seu futuro biógrafo, o jornalista Sérgio Cabral, que assim relatou o encontro ao pesquisador Pedro Paulo Malta: “Conheci Pixinguinha durante a chegada da seleção brasileira campeã mundial, em 1958. Eles vieram direto para a redação da revista O Cruzeiro, na Rua Sacadura Cabral, e foram recebidos com música pelo conjunto do Pixinguinha e a Velha Guarda. Eu, que estava lá e já era fã, aproveitei o intervalo da música para ir conversar com ele. Queria puxar o saco do Pixinguinha. Ele me disse que era Vasco, fiquei todo bobo, e aí ele me pediu para eu apresentá-lo aos três jogadores do Vasco campeões do mundo: Orlando, Vavá e Bellini. Ele ficou feliz. Conheci também o Waldemar (cavaquinho) e o Artur (violão), que passaram a me telefonar chamando para as rodas de choro. Claro que eu ia! Em tudo quanto era lugar, nos anos 50 e 60, sempre no subúrbio. Eles me chamavam e eu ia. Tenho imagens de casas de que não tenho a menor ideia de quem eram…”.

O ano registra ainda o fim das atividades de Pixinguinha como professor de música e o início do trabalho no Serviço de Educação Musical e Artística (SEMA) e na Rádio Roquette-Pinto.

1961

1961

O presidente da República, Jânio Quadros, nomeia Pixinguinha membro do recém-criado Conselho Nacional de Música. A nomeação atendia a um pedido do professor Mozart de Araújo, também conselheiro, após perceber que entre seus pares não havia sequer um representante da música popular. A nomeação, que causa perplexidade em outros conselheiros, é publicada no Diário Oficial, mas não tem qualquer desdobramento prático, especialmente após a renúncia de Jânio, em 21 de agosto.

1963

1963

Ano de produção de Sol sobre a lama, filme do crítico Alex Viany com trilha sonora composta por Pixinguinha em parceria com Vinicius de Moraes. Segundo a atriz baiana Gesse Gessy, que atua no filme e, em seguida, torna-se a sétima esposa de Vinicius, para o poeta a parceria com o chorão “foi uma coisa dos deuses, nenhum casamento valeu tanto dentro da alma quanto essa parceria com Pixinguinha”. Para o poeta, Pixinguinha era “o maior de todos os músicos populares brasileiros”, ou ainda “meu querido pai”.

O livro Pixinguinha, vida e obra (Sérgio Cabral) traz uma declaração de Alex Viany ao jornal Ultima Hora, na qual afirma que a música do nosso personagem foi uma das primeiras ideias que lhe vieram à cabeça quando optou por fazer um filme “genuinamente brasileiro”. Mais: disse que foi pensando na música de Pixinguinha que escreveu o roteiro de Sol sobre a lama, feito a quatro mãos com Miguel Torres. Já sobre as composições da trilha sonora, Sérgio Cabral informa que foram feitas principalmente na casa de Pixinguinha, em Ramos: o músico ao piano e Vinicius de Moraes com papel e lápis na mão.

Ao todo, foram 16 músicas de Pixinguinha na trilha sonora, sendo seis letradas por Vinicius, entre as quais Lamento, Samba fúnebre e a valsa Seule – esta uma composição de Pixinguinha datada de 1932 (quando foi escrita na partitura com o nome de Olhos sonhadores, tendo como parceiro o compositor potiguar Uriel Lourival) e letrada por Vinicius, em francês, especialmente para o filme.

Nesse ano, o Bar Gouveia comemora uma década da frequência quase diária de Pixinguinha, homenageando-o com uma placa e uma cadeira cativa no local. É nessa mesa que, a propósito da morte do compositor Lamartine Babo (em 16 de junho, aos 59 anos), ele comenta com seu futuro biógrafo, o jornalista Sérgio Cabral: “O meu medo é, um dia, olhar em volta e não ver mais ninguém do meu tempo”.

1964

1964

Sai pela CBS a primeira gravação da suíte Retratos, composta em quatro movimentos para bandolim e orquestra por Radamés Gnattali, que dá ao primeiro movimento o nome de Pixinguinha. Participam do disco Jacob do Bandolim, Radamés Gnattali e a orquestra da gravadora CBS.

Em 25 de junho, Pixinguinha passa mal em casa e é levado às pressas para o Hospital Getúlio Vargas, onde é diagnosticado com um edema pulmonar. No dia seguinte, quando complicações cardíacas agravam seu quadro clínico, é transferido para o Instituto de Cardiologia Aloísio de Castro, onde permanece internado por 50 dias. Um período penoso para o músico, mas que, na mesma medida, rende composições como Mais três dias (inspirada no tempo que lhe dizem – repetidas vezes – faltar para receber alta), Manda brasa (a partir da frase que a cozinheira lhe diz toda vez que traz a refeição), Mascote (dedicada a uma enfermeira que daria sorte) e Vou pra casa (quando recebe alta), entre outras. Mesmo depois de deixar o hospital, Pixinguinha seguirá fazendo eletrocardiogramas quinzenalmente, sendo que a partir de novembro o médico Eugênio da Silva Carmo pedirá ao paciente que toque solos de saxofone durante os exames periódicos.

1966

1966

Ano do lançamento fonográfico dos dois maiores sucessos da parceria de Pixinguinha com Vinicius de Moraes: um deles é o samba Mundo melhor, escolhido como faixa de abertura do LP Muito Elizeth, de Elizeth Cardoso, editado pela Copacabana. O outro é o choro Lamento (que antes de receber versos de Vinicius se chamava Lamentos, no plural), registrado por Elizeth no mesmo disco e também pelo conjunto vocal MPB-4 em seu primeiro LP, intitulado MPB-4 e lançado pela gravadora Elenco.

No dia 6 de outubro, Pixinguinha participa da série Depoimentos para a Posteridade, do Museu da Imagem e do Som (MIS), gravando depoimento sobre sua própria trajetória, tendo como entrevistadores o poeta e produtor Hermínio Bello de Carvalho, o crítico Cruz Cordeiro, o jornalista Ilmar Carvalho e o pesquisador Ary Vasconcelos. A quantidade de imprecisões no depoimento leva o grande músico e pesquisador meticuloso Jacob do Bandolim (amigo e admirador ardoroso de Pixinguinha) a revirar arquivos atrás de informações sobre o passado do flautista e saxofonista. A principal descoberta ele faz na Igreja de Santana, onde apura – na certidão de batismo de Pixinguinha – que ele não havia nascido em 1898, como todos acreditavam, mas sim em 1897.

Diante da novidade, Pixinguinha pede ao amigo que mantenha a descoberta em sigilo, para não atrapalhar as festas/homenagens que já estavam agendadas para 1968. Somente após a morte de Jacob, em agosto de 1969 (aos 51 anos, vítima de ataque cardíaco), a nova data de nascimento de Pixinguinha virá à tona, revelada pela viúva (Adília) e pela filha (Elena) do bandolinista.

O ano é marcado ainda pela aposentadoria de Pixinguinha como servidor do antigo estado da Guanabara e pela composição do Hino de Ramos, feito em homenagem aos 80 anos do bairro, com letra do professor Alberto Lima (“Ramos, Ramos, nós te adoramos!”).

1967

1967

Ano de seguidas homenagens, a começar pelo dia 23 de julho, quando Pixinguinha recebe do Clube de Jazz e Bossa (clube de jazzófilos liderado pelo playboy Jorginho Guinle que se reunia no Café-Concerto Casa Grande) o diploma de Comendador da Ordem da Bossa: em retribuição, tira do estojo o saxofone e toca Carinhoso, acompanhado por Tom Jobim ao piano – na gravação, ouve-se o público cantando a letra de João de Barro, liderado pelo canto de Ismael Silva. Em setembro, é um dos presentes no Palácio do Itamaraty – ao lado de Tom, Vinicius de Moraes, Gilberto Gil e Elis Regina, entre outros – num almoço oferecido aos artistas pelo ministro das Relações Exteriores, Magalhães Pinto. Em 30 de novembro, é condecorado com a Ordem do Mérito do Trabalho pelo ministro do Trabalho, Jarbas Passarinho, e, em dezembro, o tributo se dá na TV Tupi, no programa da cantora e atriz Bibi Ferreira.

O ano registra ainda a participação de Pixinguinha – como compositor – na era dos concorridos e turbulentos festivais musicais de TV. No III Festival de Música Popular Brasileira, promovido pela TV Record em São Paulo, tem o samba Isso não se faz (parceria com Hermínio Bello de Carvalho defendida por Elza Soares) eliminado logo na primeira fase. Já o choro Mascote, que é rebatizado com o nome de Fala baixinho após receber versos de Hermínio, é defendido por Ademilde Fonseca no II Festival Internacional da Canção (no Rio), terminando na 8ª colocação.

1968

1968

Nos dias 10, 11 e 17 de janeiro, Pixinguinha entra em estúdio com Clementina de Jesus e João da Bahiana para gravar o LP Gente da antiga, que sairá pela Odeon com produção de Hermínio Bello de Carvalho. O disco, feito com a proposta de “reviver as antigas festas da Penha” (como o próprio Hermínio escreve na contracapa), traz no repertório regravações de antigos choros e também três lançamentos: os choros Elizete no chorinho e Aí, seu Pinguça (ambos de Pixinguinha) e o samba Batuque na cozinha, composto e interpretado por João da Bahiana. A bela capa do LP é uma foto em preto e branco de Pedro de Moraes em que se vê os sorridentes Pixinguinha, João da Bahiana e Clementina vestidos como “gente da antiga”. “Acho que a velhice não apaga o essencial e, pelo contrário, dá a coloratura exata e até dimensiona o verdadeiro artista”, escreve Hermínio na contracapa do LP.

Em 22 de abril, Pixinguinha participa pela segunda vez da série Depoimentos para a Posteridade, do MIS, gravando novo testemunho sobre sua própria trajetória (“que será anexado ao depoimento feito por Pixinguinha em 1966”, como avisa o responsável por abrir a gravação, Ricardo Cravo Albin), desta vez com a participação de Jacob do Bandolim na mesa de entrevistadores – ao lado do poeta e produtor Hermínio Bello de Carvalho e do radialista e músico Paulo Tapajós.

 

No dia seguinte, quando todos acreditavam tratar-se do 70º aniversário de Pixinguinha (ele na verdade comemorava o 71º), sua programação começa no Gouveia e depois emenda na Assembleia Legislativa, onde, ao lado dos inseparáveis Donga e João da Bahiana, assiste a uma sessão solene em sua homenagem. Já no dia 26 de abril, é a vez de comemorar seu aniversário na Churrascaria Tijucana, que abre suas portas para 200 convidados, entre eles o governador da Guanabara, Negrão de Lima.

Mas festa, mesmo, é a que acontece no dia 18 de maio, quando o Museu da Imagem e do Som promove no Theatro Municipal um grande concerto em sua homenagem. Instalado no camarote presidencial (com Betty, Donga, João da Bahiana e Lúcio Rangel), Pixinguinha vê suas músicas serem interpretadas por Radamés Gnattali, Jacob do Bandolim, o conjunto Época de Ouro e outras atrações. O espetáculo resulta no LP Pixinguinha 70, que é lançado nesse mesmo ano pelo Museu da Imagem e do Som.

Mais uma vez ao lado de Hermínio Bello de Carvalho, Pixinguinha concorre em um festival de música: a Bienal do Samba, promovida em São Paulo pela TV Record. Desta vez, a composição dos dois se chama Protesto, meu amor, que é defendida pela cantora Neide Mariarrosa e chega à final – vencida por Lapinha (Baden Powell e Paulo César Pinheiro).

1969

1969

Em janeiro, Pixinguinha e Betty vendem a casa da Rua Pixinguinha e se mudam para uma casa de vila alugada na Rua Pedro Teles, 423, em Jacarepaguá. O ano é marcado ainda por um show em Porto Alegre ao lado de Clementina de Jesus, um LP no qual acompanha uma cantora (Carmem Barbosa com conjunto de Pixinguinha e B. Lacerda, que sai pelo selo Dar Lar) e um acidente que sofre após ser entrevistado na Rede Globo: a Kombi que o levava para casa bate em outro carro e faz Pixinguinha sofrer um corte na boca – mais tarde, diria ao Jornal do Brasil: “Os pontos viraram calos que me doem muito quando toco. Não tem mais jeito”.

Em fevereiro, desembarca no Brasil o cineasta francês Pierre Barouh, que grava em película artistas da velha e da nova guarda da música popular brasileira. Pixinguinha está na primeira turma (com João da Bahiana), como se pode ver no filme Saravah, que sai em 1972, trazendo nosso personagem em duas situações: numa conversa de bar com Barouh, ao lado do violonista Baden Powell, da cantora Clementina de Jesus e do marido dela, Albino Pé Grande; e tocando Lamentos no saxofone, com acompanhamento de Baden ao violão. O filme tem ainda as participações de Paulinho da Viola e das cantoras Maria Bethânia e Márcia, além de imagens do desfile da Estação Primeira de Mangueira no carnaval de 69.

Em 13 de agosto, morre aos 51 anos o grande amigo e admirador Jacob do Bandolim, depois de sofrer um infarto quando chegava em casa, logo após visitar Pixinguinha.

O mesmo ano registra o lançamento, no Festival de Brasília, do documentário em preto e branco de curta-metragem Pixinguinha, rodado em 1966 pelo cineasta e produtor petropolitano João Carlos Horta, que filmou seu personagem à vontade em casa (ainda em Ramos), de pijama, mostrando seu ambiente, tocando seu saxofone e dedilhando o velho piano Gaveau que tinha em casa e que usava como instrumento de apoio para fazer seus arranjos.

1970

1970

As dificuldades financeiras fazem que Pixinguinha e Betty tenham que se mudar novamente, desta vez para Inhaúma, mais especificamente para o Conjunto Residencial dos Músicos, bloco 10, apartamento 101. Pixinguinha agora é vizinho de antigos companheiros de samba, como Bide e Bucy Moreira. Nas cercanias da nova residência, a Confeitaria Deise é eleita seu novo “escritório”, mas só nos fins de semana… De segunda a sexta, as idas ao Gouveia continuam sagradas.

A série de LPs História da Música Popular Brasileira (RCA/Abril Cultural) dedica um volume inteiro a Pixinguinha, que tem 8 antigas gravações compiladas em LP e sua trajetória contada em um libreto. A mesma série será reeditada (atualizada e ampliada) pela Abril Cultural em 1976 (Nova História da Música Popular Brasileira) e 83 (História da Música Popular Brasileira – Grandes compositores), em ambas as vezes com volumes dedicados a Pixinguinha.

1971

1971

Sai pela Odeon o LP Som Pixinguinha, produzido por Hermínio Bello de Carvalho, com Pixinguinha interpretando composições de sua autoria (exceto Odeon, de Ernesto Nazareth). Lançado no bar Gouveia, o disco traz as últimas gravações feitas por Pixinguinha.

1972

1972

O selo Fontana/Philips lança a série de LPs No tempo dos bons tempos, com dois volumes dedicados a Pixinguinha: Pixinguinha e sua gente (na capa, Pixinguinha aparece tocando seu saxofone no traço de Nássara) e Pixinguinha no carnaval e a Velha Guarda também. No mesmo ano, é lançado o documentário de curta-metragem Conversa de botequim, do cineasta carioca Luiz Carlos Lacerda (o Bigode), que tem como personagem central João da Bahiana, mostrado em ambientes como o bar Gouveia, onde conversa com os amigos Donga e Pixinguinha.

Em 7 de junho, morre aos 73 anos Betty. Sofrendo de complicações cardíacas, ela estava internada no Instituto de Assistência dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro (o Iaserj) desde maio, sem perspectivas de recuperação. Durante sua internação, Pixinguinha também teve um princípio de infarto, sendo internado pelo filho no mesmo hospital. Para não preocupar a esposa, trocava o pijama do Iaserj pelo terno na hora de visitá-la, para que ela pensasse que ele estava vindo de casa. “Tudo que se tem, tudo quanto se fez, não é nada quando se perde o amor. O nosso grande amor”, disse o viúvo Pixinguinha, como se lê em sua biografia escrita por Marília Trindade Barboza e Arthur de Oliveira Filho (Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento).

1973

1973

Na manhã do dia 17 de fevereiro, dois sábados antes do carnaval, Pixinguinha recebe em casa a visita do poeta e produtor Hermínio Bello de Carvalho, do fotógrafo Walter Firmo e do músico Eduardo Marques. Conversam amenidades, ouvem música e, na hora da despedida, Pixinguinha chora. À tarde, veste seu terno marrom e sai de Inhaúma, acompanhado pelo filho Alfredinho, em direção à Igreja de Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, para batizar o filho de seu amigo Euclides Souza Lima. Como presente para o bebê, leva uma partitura manuscrita de Carinhoso. Porém, no momento em que se prepara para assinar seu nome no livro da igreja, Pixinguinha cai em pleno altar, fulminado por um infarto (causa mortis: arteriosclerose, miocardiosclerose, rotura de aneurisma da aorta abdominal).

A Banda de Ipanema, que faz um desfile pré-carnavalesco nesse dia, passa em frente à igreja quando se espalha entre os foliões a notícia da morte de Pixinguinha. O desfile termina em frente ao templo, molhado pela chuva que tinha acabado de cair e pelo choro de seus foliões – entre eles Hermínio. O velório é realizado naquela noite na sede do Museu da Imagem e do Som e o sepultamento, às 16h do dia seguinte, se dá no Cemitério de Inhaúma (zona norte do Rio), quadra 60, sepultura 3868. A biografia Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento (Marília Trindade Barboza e Arthur de Oliveira Filho) informa que não houve discurso nem extrema unção, mas sim o Carinhoso cantado pelos presentes, que acenavam com lenços. No dia 24 de novembro, seu restos mortais e os de Betty seriam trasladados para o lote 415 do Cemitério Jardim da Saudade, no bairro de Sulacap.

 

No dia 2 de julho, estreia na Rede Globo a novela Carinhoso, de Lauro Cesar Muniz, que tem como tema de abertura uma interpretação jazzística de Márcio Montarroyos para o choro-título da novela, que ficará em cartaz até 12 de janeiro de 1974 (data, aliás, em que falece João da Bahiana, aos 86 anos, no Retiro dos Artistas). O ano registra ainda o lançamento do LP Pixinguinha (RCA Camdem), reunindo choros de Pixinguinha gravados pelo próprio e por compositores diversos.

1974

1974

No dia 24 de fevereiro, domingo de carnaval, Pixinguinha é homenageado no enredo que a escola de samba Portela leva ao seu desfile na Avenida Presidente Antônio Carlos, intitulado O mundo melhor de Pixinguinha. Com samba-enredo de Evaldo Gouveia e Jair Amorim, a escola de Oswaldo Cruz conquista o vice-campeonato do carnaval carioca, vencido naquele ano pela Acadêmicos do Salgueiro.

Em 25 de agosto, morre no Retiro dos Artistas, aos 84 anos, Ernesto Joaquim Maria dos Santos, o Donga.

1975

1975

Sai pela Discos Marcus Pereira o LP Pixinguinha, de novo, com choros do homenageado interpretados pelos flautistas Altamiro Carrilho e Carlos Poyares.

1976

1976

Nos dias 5 e 12 de novembro, a Rede Globo dedica dois programas da Sexta Super para contar a história de Pixinguinha e exibir números musicais gravados especialmente para a ocasião, com Elza Soares, Altamiro Carrilho e Orlando Silva, entre outros. O ano registra ainda a produção do LP Choradas, chorões, chorinhos, em dois volumes, sendo o segundo deles inteiramente de choros inéditos de Pixinguinha tocados por intérpretes variados – infelizmente, o público não tem acesso ao disco, produzido como brinde pela Companhia Internacional de Seguros. Já o selo Fontana lança o LP duplo Pixinguinha.

1977

1977

A recém-criada Fundação Nacional de Artes (a Funarte, então ligada ao Ministério da Educação) escolhe o nome de Pixinguinha para batizar sua primeira grande iniciativa: uma série de turnês que – criada a partir do Projeto Seis e Meia (de Albino Pinheiro) – apresenta a preços populares shows reunindo artistas brasileiros que estão à margem do grande mercado. É o Projeto Pixinguinha (lançado com o slogan “um projeto carinhoso”), que tem como coordenador-geral Hermínio Bello de Carvalho. Realizado desde então (continuamente até 1989 e depois com muitas interrupções), é até hoje a iniciativa mais bem-sucedida e mais conhecida da Funarte. A estreia do Projeto Pixinguinha se dá a 5 de agosto, no Teatro Dulcina (Centro do Rio), com um espetáculo de Nana Caymmi com Ivan Lins.

O ano é marcado também pelo lançamento, pela Continental, do LP Conjunto Época de Ouro interpreta: Pixinguinha – Benedito Lacerda.

1978

1978

Além do Projeto Pixinguinha, que faz sucesso com suas caravanas musicais, outra iniciativa frutífera da Funarte é o concurso de monografias, criado pela Consultoria de Projetos Especiais da instituição, com a proposta de promover/publicar biografias sobre grandes personagens da música brasileira, a começar por Pixinguinha, que naquele ano de 1977 (ano de abertura do concurso) tinha comemorados os 80 anos de seu nascimento. O vencedor desta primeira edição é o jornalista Sérgio Cabral, que então lança, pela Funarte, a primeira edição da biografia Pixinguinha, vida e obra.

A propósito do lançamento da biografia, a Rede Globo distribui como brinde nesse ano o LP duplo Pixinguinha, vida e obra, com 21 faixas – com as composições de Pixinguinha interpretadas pelo próprio e por outros músicos – selecionadas por Sérgio Cabral.

1979

1979

O júri do concurso de monografias da Funarte – que futuramente se chamará Projeto Lúcio Rangel – decide dar uma menção honrosa a outro projeto de biografia de Pixinguinha, escrita por Marília Trindade Barboza e Arthur Loureiro de Oliveira Filho, e decide publicar também este livro, intitulado Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento.

1982

1982

A Funarte lança, através do Projeto Almirante (de discos de música popular), o LP Vivaldi e Pixinguinha, que é produzido por Hermínio Bello de Carvalho reunindo o veterano Radamés Gnattali e os jovens chorões da Camerata Carioca. No repertório, aproximam-se choros de Pixinguinha (como Carinhoso, Um a zero e Marreco quer água) e o Concerto grosso opus 3 nº 11 – Estro armonico, do compositor veneziano Antonio Vivaldi, com seus movimentos Allegro, Largo e Allegro final.

1983

1983

Por ocasião dos dez anos de morte de Pixinguinha, é apresentado na Sala Funarte Sidney Miller o show Uma rosa para Pixinguinha, com a cantora Elizeth Cardoso, o pianista e arranjador Radamés Gnattali e o conjunto de jovens chorões Camerata Carioca. Tendo no repertório músicas como a valsa Uma rosa para Pixinguinha (de Radamés Gnattali), o show – produzido por Hermínio Bello de Carvalho – é gravado e lançado em disco nesse mesmo ano, pela Funarte.

1989

1989

Ano de lançamento, pela gravadora Kuarup, do disco Orquestra Brasília – O maior legado escrito de Pixinguinha, produzido por Henrique Cazes a partir de partituras de encontradas por ele na Biblioteca Nacional. Entre as anotações do velho chorão, feitas em 1948, estão indicações sobre a formação e o nome do conjunto, batizado pelo próprio Pixinguinha de Orquestra Brasília.

1994

1994

O selo curitibano Revivendo lança o CD Oito Batutas, reunindo todas as 20 gravações realizadas pelo conjunto de Pixinguinha, Donga e companhia na Victor argentina durante a estada em Buenos Aires, em 1923.

1996

1996

No dia 23 de abril, é inaugurada na Rua do Ouvidor, em frente ao local onde ficava o bar Gouveia, uma estátua de Pixinguinha com 1,70 m de altura, feita em bronze pelo escultor Otto Dumovich. A inauguração do monumento – feito por iniciativa da Associação dos Amigos da Travessa do Ouvidor (ATO) – reúne o filho do homenageado, Alfredinho, e amigos como João de Barro, Ademilde Fonseca (que canta Carinhoso) e Altamiro Carrilho (que toca O gato e o canário e Esta vida é um buraco, esta última dedicada às obras do prefeito Cesar Maia). O evento marca a abertura do ano de comemorações até o centenário de nascimento de Pixinguinha, comemorado em 1997.

Entre os destaques fonográficos do ano está o CD Orquestra Pixinguinha, lançado originalmente em 1991, pela gravadora MCA do Japão. O cavaquinista Henrique Cazes é o diretor da orquestra e do disco, que traz novas gravações para arranjos originais de Pixinguinha e que propõe misturas curiosas, como a faixa que emenda o ragtime do norte-americano Scott Joplin (The entertainer) com o choro Ainda me recordo, de Pixinguinha.

1997

1997

O ano em que se comemora o centenário de nascimento de Pixinguinha é repleto de homenagens, sobretudo no mercado fonográfico. Entre os discos gravados para a ocasião estão Paulo Moura e Os Batutas, que sai pela gravadora Velas, e Agô, Pixinguinha, produção de Hermínio Bello de Carvalho lançada pela Som Livre com dois discos: no primeiro (intitulado Sambando, chorando), estão composições de Pixinguinha nas vozes de Paulinho da Viola (De mal pra pior), Chico Buarque (Lamento), Maria Bethânia (Fala baixinho) e Zeca Pagodinho (Gavião calçudo), entre outros. Já o segundo disco (que se chama Tocando, tocando) reúne fonogramas de composições de Pixinguinha interpretadas pelo próprio e por outros grandes nomes, como Tom Jobim (Carinhoso) e Hermeto Pascoal (Rosa). Chegam também às lojas a coletânea dupla Pixinguinha 100 anos (lançada pela BMG) e alguns relançamentos, como os CDs Pizindin – 100 anos de Pixinguinha, de Teca Calazans (feito originalmente em 1990, na França, e lançado no Brasil pela Atração Fonográfica), Sempre Pixinguinha – 100 anos (lançado pela Kuarup a partir de um disco feito como brinde, em 1988) e o álbum ao vivo Pixinguinha 70 (relançado pelo MIS, agora no formato CD).

A efeméride é festejada também com uma série de shows produzida pelo Centro Cultural Banco do Brasil: Pixinguinha 100 anos, que é dirigida por Maurício Carrilho e Paulo Sérgio Santos e reúne músicos como Paquito D’Rivera, Joel Nascimento, Cristóvão Bastos, Laércio de Freitas, Luciana Rabello e Marcos Suzano, entre outros. A série tem seus melhores momentos reunidos em um disco lançado pela Sarau – produtora do evento – em CD nesse mesmo ano. Já o mercado editorial aproveita a data para relançar as duas biografias publicadas pela Funarte no fim dos anos 70: Pixinguinha, vida e obra (Sérgio Cabral) é reeditada pela Lumiar, enquanto Pixinguinha, filho de Ogum bexiguento (Marília Trindade Barboza e Arthur Loureiro de Oliveira Filho) sai pela Gryphus.

O centenário é festejado também com o lançamento de um selo comemorativo pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos e uma exposição, na Pinacoteca do Estado (São Paulo), reunindo fotografias de Pixinguinha tiradas por Walter Firmo, entre elas a famosa foto do chorão no quintal de sua casa, sentado na cadeira de balanço com o saxofone no colo.

1999

1999

Ano de lançamento do livro Pixinguinha para crianças: uma lição de Brasil, de Carlos Alberto Rabaça, lançado pela editora Multiletra com patrocínio da Petrobras. A publicação traz encartado um CD com composições de Pixinguinha num recorte para o público infantil (Dança dos ursos, Pula sapo, Samba na areia etc.), com novas gravações arranjadas por Henrique Cazes.

2000

2000

O Instituto Moreira Salles (IMS) passa a abrigar o arquivo pessoal de Pixinguinha, por acordo direto com a família do chorão, que entrega para a guarda da instituição inúmeros itens, como fotografias, documentos, álbuns, troféus, roupas, uma flauta e um conjunto de aproximadamente mil partituras – devidamente catalogadas e digitalizadas por uma equipe de especialistas em choro e música formal. O resultado do trabalho em cima do Acervo Pixinguinha são produções como os concertos Pixinguinha na Pauta (realizado em 2010, no Teatro Carlos Gomes) e Outras pautas: Pixinguinha em concerto (apresentado em 2014, no Rio e em São Paulo), além de uma série de livros/caixas de partituras, como Pixinguinha: inéditas e redescobertas (2012), Pixinguinha: outras pautas (2014) e O carnaval de Pixinguinha (2014). O tratamento do Acervo Pixinguinha resulta também na série de rádio Pixinguinha na pauta, com 13 programas veiculados na Rádio MEC ao longo de 2016 (e disponibilizados para audição em streaming na Rádio Batuta, do IMS).

O ano será marcado também pela promulgação da lei federal que, em 4 de setembro, transforma em Dia Nacional do Choro o dia 23 de abril, aniversário de Pixinguinha. Entre os lançamentos fonográficos do ano, destacam-se dois CDs dedicados ao chorão: Pixinguinha de bolso (com Henrique Cazes e Marcello Gonçalves, pela Kuarup) e Pixinguinha de alma e corpo – disco independente que reúne o flautista e saxofonista Carlos Malta com o quarteto de cordas formado por Hugo Pilger, Jayro Diniz, Mariana Salles e Ricardo Amado. E Carinhoso fica em primeiro lugar no concurso promovido pela Rede Globo, que pergunta a um júri de personalidades qual a música mais importante do século 20 – Aquarela do Brasil (Ary Barroso) é apontada como hors-concours.

2002

2002

O conjunto Água de Moringa lança pela Sony Music o CD As inéditas de Pixinguinha, que tem no repertório 12 choros e participações especiais de Martinho da Vila, Monarco e Nei Lopes.Já pela Biscoito Fino sai o CD Teu nome, Pixinguinha, no qual o cantor e ator Marcelo Vianna interpreta composições do avô, com participações especiais de Rita Ribeiro, João Nogueira e o conjunto Pedro Luís e a Parede.

2003

2003

Ano do falecimento de Alfredo da Rocha Vianna Neto, o Alfredinho.

2010

2010

Em 13 de novembro, estreia no Oi Futuro Flamengo o musical infantil Moleque Pizindim, idealizado por Marcelo Vianna e escrito por Heloisa Pinheiro, Patrícia Fontoura e Antonio Karnewale, este último também diretor da peça.

2012

2012

De 13 de março a 6 de maio, o Centro Cultural Banco do Brasil de Brasília abriga a mostra Pixinguinha, com fotografias, documentos pessoais e instrumentos do músico – parte dos itens da mostra são cedidos pelo Instituto Moreira Salles, que apoia a mostra. Na inauguração, o Teatro Nacional (Brasília) abriga o concerto Pixinguinha Sinfônico, interpretado pela Orquestra Sinfônica Cláudio Santoro, com regência de Cláudio Cohen.

2013

2013

Nesse ano, registra-se o lançamento do CD Mundo de Pixinguinha, no qual o bandolinista Hamilton de Holanda interpreta as composições de Pixinguinha em dueto com músicos como o trompetista americano Wynton Marsalis, o pianista italiano Stefano Bollani e o pianista cubano Chucho Valdés, entre outros. A gravação do show de lançamento do CD, realizado no dia 9 de setembro, resultou no DVD de mesmo nome, lançado em 2016.