ORQUESTRA VICTOR BRASILEIRA (1929-1935?)
O ano de 1929 marca mais um passo decisivo na carreira de Pixinguinha: ele é contratado pela Victor como maestro e arranjador da Orquestra Victor Brasileira. Sem dúvida, o convite se deveu ao reconhecimento, por parte dos dirigentes da Victor, de seu trabalho como instrumentista e arranjador em outros grupos, como a Orquestra Típica Pixinguinha-Donga e a Orquestra Típica Oito Batutas. O novo cargo não só conferia prestígio ao compositor – afinal, fora contratado por uma das mais importantes gravadoras mundiais, a Victor Talking Machine, que chegava ao Brasil neste período para fazer concorrência com a Odeon – como o permitia melhorar financeiramente: o salário, de um conto e duzentos, era tão bom que permitiu que Pixinguinha comprasse um automóvel, segundo informação de Sérgio Cabral em sua biografia do compositor.
O mesmo Sérgio Cabral nos informa que a Victor instalou seus escritórios na Rua do Ouvidor, nº 15 (significativamente a mesma rua onde, décadas antes, a Casa Edison iniciou suas atividades). O estúdio de gravação ficou instalado na Rua do Mercado, nº 22, terceiro andar, tendo como técnicos responsáveis os norte-americanos John Penninger e Richard Leslie Evans: este último se tornaria logo depois o diretor artístico da gravadora, passando a ser conhecido popularmente entre os músicos como Mr. Evans.
A determinação da formação da orquestra e dos músicos que a compunham é novamente tarefa difícil de ser feita com precisão, em parte porque a Orquestra Victor Brasileira, a partir da década de 1930, trabalhou com vários maestros diferentes, além de Pixinguinha. O pesquisador José Silas Xavier relaciona os nomes de Bernardino Vivas, regente da orquestra nos célebres registros de Bidu Sayão (feitos em 23 de outubro de 1933, quando a famosa soprano gravou algumas peças, entre elas a secular Casinha pequenina), Gabriel Migliori, Rondon, João Martins, Harry Kosarin (cuja orquestra fez diversas gravações com Carmen Miranda) e, a partir de 1932/33, Radamés Gnattali.
De qualquer forma, é razoável supor que Pixinguinha tivesse levado para a Orquestra Victor Brasileira o núcleo de músicos que já o acompanhava em empreitadas anteriores, como Bonfiglio de Oliveira (trompete), Donga (violão, cavaquinho e banjo) e João da Bahiana (pandeiro e percussão). A estes nomes, Sérgio Cabral acrescenta os de Luís Americano (saxofone e clarineta), Luperce Miranda (bandolim e cavaquinho), Esmerino Cardoso e Vantuil de Carvalho (trombones), Augusto Vasseur (piano), Luciano Perrone (bateria) e Faustino da Conceição (percussão). Como em outros grupos orquestrais de Pixinguinha, a formação poderia variar de acordo com cada faixa gravada.
Embora a discografia da Orquestra Victor Brasileira registre centenas de gravações, é quase certo que Pixinguinha esteve à frente da orquestra como maestro e arranjador em cerca de trinta músicas somente, nas quais é possível identificar a típica marca de seus arranjos. Em última análise, a Orquestra Victor Brasileira, já desde o início da década de 1930, passa a ser uma espécie de marca de fantasia, assumindo diferentes características de orquestração e instrumentação de acordo com cada maestro que a comandava.
Como afirma Sérgio Cabral: “Na Victor, Pixinguinha ia dando nomes diferentes às orquestras que dirigia, dependendo do tipo de música gravada, mas mudando muito pouco de instrumentistas. Embora sem cumprir rigorosamente a divisão, a Orquestra Victor ficou com as canções mais lentas, a Diabos do Céu com as músicas carnavalescas e o Grupo da Guarda Velha também com marchas e os sambas de carnaval, além de choros e músicas de sabor africano” (pág. 131).
Dentre as primeiras gravações lançadas por Pixinguinha frente à Orquestra Victor Brasileira estão a marcha pernambucana Não puxa Maroca (de autoria de Nelson Ferreira), o choro Suspiros (de Desmond Gerald), o maxixe Aborrecido (do compositor paulista Mauricio Braga) e os seus próprios choros Vem cá, não vou (posteriormente rebatizado como Tô fraco) e Urubatan. Estas duas últimas músicas foram lançadas pela gravadora sob a denominação de “choros orquestrais”, o que gerou alguns protestos da revista Phono-Arte.